- Episódio Regular #3

Tops, Bottoms, Relações e Dinâmicas

O terceiro episódio do Chicotadas se chama “Tops, Bottoms, Relações e Dinâmicas”, mas poderia muito bem se chamar “Princípios Básicos do BDSM III”. Dessa vez, a equipe conversa sobre a autoidentificação e rótulos no BDSM, os inúmeros títulos e posições que tops, bottoms e switchers podem assumir, assim como algumas das plays, dinâmicas e duplas top/bottom mais populares nesse universo. Também abordamos temas como diferentes formas de trocar poder, pet play, age play, primal play, topping from the bottom, relações comerciais que envolvem BDSM e muito mais! Vem ouvir esse bate-papo divertido com muita risada (e uma certa dose de bratices?) e conta pra gente: com quem você se identifica? Que tipo(s) de top/bottom você é?

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Participantes: Ada, Hugo, Kali.

A vitrine do episódio tem uma foto de um busto feminino, usando sutiã, harness e algemas de couro, com filtro escuro com o título do episódio e a logo original do Chicotadas (a silhueta de um chicote longo posicionada para lembrar uma onda sonora, dentro de retângulo sólido).

Hugo: [beep] Atenção: esse conteúdo é produzido por adultos, para adultos, e não deve ser consumido por menores. Se você ainda não tem 18 anos, nós não damos o nosso consentimento para que você continue escutando.

Kali: Aqui é a Kali, top, demigirl, bissexual, e hoje a minha frase de segurança é "Onde está o raio do meu escravo doméstico para me ajudar com essa mudança?"

Ada: Me copiou da semana passada, amiga. [Risos]

Kali: Eu sei, mas é porque eu tô sofrendo.

Hugo: Aqui é o Hugo, sou homem hétero cis, switcher, e minha palavra de segurança hoje é "Finalmente temos o resultado das eleições". Nossa, vai ficar bem engraçado, mas tá... Um velho menos pior do que o velho maluco laranja.

Ada: Aqui é a Alene, ou Ada, domme, mulher cis, demissexual, e hoje a minha palavra de segurança é "Finalmente eu tô vendo a Kali de novo!" A gente tá no mesmo ambiente, bem distantes, mas estamos. Ela tá sem internet.

Kali: Dá uns 3 metros, quase 4, né? Estamos fazendo um bom distanciamento social aqui.

Ada: Esperamos que o som não fique diferente demais para vocês, mas se vocês estiverem reparando em algum pequeno eco, alguma coisa do tipo, é isso. Desculpa, galera.

Kali: A culpa é da Copel, não é nossa. Eles não quiseram instalar minha internet há tempo.

Kali: [som de chicote] Você está ouvindo o Chicotadas, um podcast entre tapas e cuidados, e demais gostos peculiares pelos quais você talvez se interessaria. Aqui nós vamos conversar sobre BDSM, sexualidade, não monogamia, poliamor e estilos de vida alternativos.

Ada: Este podcast é produzido por três amigos praticantes e membros ativos da comunidade BDSM, com diferentes gostos, anos de estrada e experiências. E a gente espera que você goste de nos ouvir e debater conosco sobre esse universo tão vasto e excitante.

Hugo: Hoje vamos falar sobre as posições, quais são os tipos de jogos que existem e como é que funciona essa troca de poder que a gente comentou nos episódios passados. Lembrando sempre do consentimento, só para maiores, aquelas coisas todas que a gente já falou e vai estar sempre retomando aqui.

Kali: E assim, tudo que a gente falar aqui nesse episódio, podemos, depois, fazer um episódio inteiro sobre isso. Então, se vocês ficaram com alguma dúvida no final do episódio, fala pra gente, não deixa passar, que daí vamos estruturando a ordem dos episódios com base naquilo que vocês mais se interessam. O objetivo é dividir o conteúdo mesmo, é trazer isso pra todo mundo de uma forma divertida, como se vocês estivessem com a gente aqui sentadinhos numa mesa de bar, tomando um suquinho de laranja, porque BDSM e álcool não combinam.

Ada: Mas conversar sobre BDSM com um pouquinho de álcool tudo bem, né? Só não fazer.

Kali: É, só não fazer.

Ada: Esse episódio aqui se chama "Tops, bottoms, Relações e Dinâmicas", porque é disso que vamos falar, tipos de tops, tipos de bottoms, tipos de relação, e as dinâmicas dentro dessas relações e alguns outros itens a respeito, algumas expressões que envolvem tops e bottoms e toda essa dinâmica que é construída.

Novamente, esse episódio tem esse nome, mas ele poderia muito bem se chamar "Princípios Básicos do BDSM 3", porque é mesmo uma continuidade do 1 e do 2. Então, se você ainda não ouviu os nossos episódios 1 e 2, ouve lá primeiro, antes de ouvir esse daqui.

Bom, e aqui vamos citar vários tipos, os tipos principais, pelo menos, de tops, bottoms e relações. De forma alguma vamos tentar ser totalmente abrangentes e citar todos os tipos que existem. Até porque, no final das contas, cada um é cada um, cada um compõe a sua persona, cada um estabelece a sua relação do jeito que é mais conveniente para as pessoas que estão naquela relação. Então, aqui é meio que um panorama geral para vocês descobrirem várias das formas principais de viver o BDSM dentro de uma relação.

Kali: Às vezes, as pessoas só querem encontrar um rótulo para aquilo que elas sentem, então vamos falar sobre alguns desses rótulos, mas se nenhum deles servir, não tem problema. Porque, às vezes, a gente é uma combinação de vários ou a gente só se identifica parcialmente com eles.

Ada: Não se sinta obrigado a ter seu rótulo. Se você acabou de chegar, as pessoas ficam muito angustiadas "eu preciso saber o que eu sou, eu preciso saber o que eu sou", às vezes existe a pressão de alguém perguntar: mas o que você é? E você não precisa saber, gente.

Às vezes, você tem 10, 15, 20 anos de comunidade e você ainda não sabe, ou você troca e tá tudo bem.

Hugo: Falando em não saber o que é... Alene, o que eu sou? Agora que a gente tá jogando há uns três meses?

Ada: Gente, olha, vou te falar, o Hugo me vendeu a ideia que ele era muito submisso, e que ele gostava de obedecer, ele gostava de controle, que ele tinha vontade de ter uma domme que controlasse o dia a dia dele.

E aí eu comecei, cara, de boa, eu tô muito de boa com o Hugo, muito de boa, até porque a gente tá à distância, tem pandemia, tem compromisso, tem trabalho, tem estudo, tem muita coisa que são outras prioridades que, com o elemento adicional da distância, fica impossível de você ter uma dinâmica muito certinha, fechadinha, né? Então eu tô muito tranquila.

E o Hugo, tem uma dificuldade pra obedecer. Tem uma dificuldade pra obedecer que eu já tô assim: Hugo, não sei se você é submisso. Não sei, amigo, acho que você gosta de obedecer quando você gosta da ordem. A estratégia que eu uso pra ele obedecer o negócio que ele não gosta muito, ele não quer, sabe? É frustrante.

Kali: Eu acho que ele é o contrário do service top. O service top gosta de aplicar as práticas que o bottom gosta, e ele é o contrário, ele é o bottom que gosta de ter um service top.

Ada: Ah… pode ser.

Kali: Que nome será que tem esse tipo de bottom?

Hugo: Então, pra vocês verem que, às vezes, nem todos os rótulos que vamos escrever nos descrevem bem. Mas, teoricamente, pra enganar as mocinhas...

Ada: Inocentes e inexperientes, com poucos anos de comunidade.

Hugo: Eu me declaro como sub, teoricamente, ou switcher, que normalmente eu gosto também da ideia de dominar, por mais que não tenha praticado tanto. Porque, por ser uma pessoa criativa, acabo sempre pensando em formas divertidas e legais de se dominar outras pessoas e tudo mais.

Agora que eu percebi que eu tô gravando no microfone errado, e a Alene vai me matar.

Ada: Nossa, Hugo, você tinha uma tarefa, Hugo. Uma tarefa!

Hugo: Olha, vocês estão vendo um exemplo do que ela acabou de falar, viu? E é real, não foi ensaiado. Eu juro. Não me mata, tia.

Ada: O Hugo é o topping from the bottom, só que ele já tem que chegar nas relações dele falando o seguinte: eu gosto de dominar por baixo, entendeu? Você vai topar ou não vai topar? Porque me cansa muito a resistência pra continuar dominando, mesmo ele tentando dominar por baixo. É exaustivo. Às vezes era melhor ter um brat que ficasse retrucando publicamente, do que um negócio do tipo vou obedecer e depois não obedece.

Kali: Vou obedecer, com aquele dedinho cruzado atrás das costas. "Sim, senhora. Ah, eu gosto de obedecer, porém depende".

Hugo: Então essa questão de se definir é difícil. Então, pra conversa rápida, eu digo que eu sou switcher, mas como vocês estão vendo, a forma com que eu gosto de jogar não é a forma que eu imagino que eu gostaria de jogar, e aí isso dá uma confusão danada. Mas são nesses rótulos falhos e imperfeitos que a gente tenta se comunicar.

Ada: Eu tenho mais uma pergunta, você fala que é switcher. Como você gosta do seu lado top e do seu lado bottom?

Hugo: Eu acho que eu sou o top normal. Assim, aquele padrão. O top que marca uma sessão, tal, provoca dor e tudo mais. Eu costumo passar...

Kali: Ser sádico.

Hugo: É, um sádico. Ah, aquele padrão ali e tal. Agora, como sub, eu não sei mesmo.

Ada: E o mais louco é que é o que você mais tem experiência, né? Tem, tipo, mais de 10 anos de sub.

Kali: É, eu tava pensando exatamente nisso. O cara passou a vida inteira como sub e, de repente, se entendeu switcher recentemente.

Como top, ele sabe certinho o que é. Agora, como bottom, Jesus Cristo...

Ada: Porque assim, a gente tava tendo essas dinâmicas, e aí eu gosto dessa coisa do dia a dia, e eu tinha entendido que ele gostava também da coisa do dia a dia, porque ele tinha me falado que ele gostava de controle, e que ele queria ter uma D/s, que queria ter uma relação.

Então eu comecei a colocar aos poucos, e aí eu vi que... Pera, não... Eu hoje, antes da gente começar essa gravação, eu perguntei, mas você não teve uma relação de longo prazo já? Que você era posse de uma domme e tal? Não tinha nada de dia a dia? Aí, o que você falou, Hugo?

Hugo: Era só durante a sessão.

Ada: Então todas as relações que você teve até hoje foram EPE (Erotic Power Exchange). Troca de Poder Erótica, só durante a sessão/cena?

Hugo: Sim, sim.

Ada: Eu tô chocada.

Kali: Como diria a Arlete, "eu tô debaixo da galinha".

Hugo: Eu não falei o contrário. Nunca disse o contrário.

Kali: Mas a gente presumiu, da forma como você sempre falou, né?

Ada: Não, mas ele me falou com todas as letras. Porque eu já tinha falado pra ele anteriormente que eu não via ele como submisso numa relação, porque ele é muito independente.

Eu brinco com o Hugo, que ele é uma pessoa que já se domina sozinho, entendeu? A outra pessoa ali é mero acessório, porque ele já sabe tudo o que ele quer, ele já faz toda a orientação, ele é tipo o reizinho do topping from the bottom. Então você tem que ter um pulso firme pra falar: não, eu vou fazer o que eu quero, não o que você tá querendo. Quem manda aqui sou eu.

Só que ele tem essa tendência, e eu tipo, ah, é porque eu sou mais inexperiente, então ele quer dar ideias e tal, não sei o que. Não, ele quer fazer o que ele quer fazer. Né, Sr. Hugo?

Hugo: Esse é aquele momento de silêncio que a gente fica com vergonha, não sabe onde colocar a fuça.

Kali: Só o grilo. [Risos]

Ada: Você acha bonito isso? Fazer isso com a pobre domme?

Hugo: Ei, Aline, nada de DR durante o podcast, lembra que a gente combinou?

Kali: Tô amando. Enquanto não tem o que falar sobre mim, eu tô bem feliz aqui, bem quietinha. [Risos]

Ada: Daqui a pouco vai chegar a sua hora, minha querida.

Hugo: Então, pessoas, se definir e dizer o que de fato você gosta é um trabalho complicado, digo por experiência própria, como esse breve exemplo deu a entender.

E aí, Pati? E você? Como é que você se define? Já que você está rindo tanto da minha desgraça?

Kali: Complicado. Quando eu comecei no BDSM, eu tinha aquela ideia, bem machista, inclusive, de que o homem manda e a mulher obedece. Tinha mesmo, eu assumo, eu tinha 23 anos, era uma criança, praticamente. No meio no qual eu estava inserida, algumas das pessoas perpetuavam essa ideia, mas, foi bem engraçado, uma amiga minha, ela virou pra mim e falou: cara, você não é sub.

Eu bati o pé, sou sim, sou sim. Fiquei um tempão tentando ser sub, com meu ex-marido, ele foi meu primeiro top, e não rolou, não deu boa. A gente tretava durante a sessão, eu só queria fazer o que eu queria fazer. Era 10 vezes pior que o Hugo nesse quesito, do tipo "não, você tá batendo errado", não, era masoquista, né, também. Aí, eu meio que abandonei essa ideia e já naquela época eu já amarrava. Então, a conta não fechava, eu dizia que eu era sub, mas eu gostava de amarrar os outros num contexto de troca de poder.

Aí, em 2016, depois de várias conversas com um grupo de amigas, em especial a Sansa, beijo, Sansa, se estiver nos ouvindo. Beijo, Sansa, você é maravilhosa, a gente ama. Se não estiver nos ouvindo, vai ouvir sim, porque você é nossa amiga e tem que ouvir.

Eu conversei muito com a galera e tal, e daí eu consegui me entender como top, aí eu tava tipo, plena e faceira como top. Todo mundo olhava e falava: não, com certeza, a Kali é só top. Daí eu conheci uma pessoa que despertou em mim a vontade de me submeter.

E daí eu tô num dilema infinito aqui, porque eu não consigo me considerar submissa se não for a essa pessoa, tipo, porque pra mim tá 100% ligado. Eu nunca tive com mais ninguém essa vontade de me entregar, me submeter e o escambau. Gente, sério, quem me conhece há um longo tempo, sabe que se tem uma coisa que eu gosto é dormir. Eu coloco o despertador pra pelo menos meia hora mais cedo, quando ele dorme na minha casa, pra fazer café pra ele. Ele nunca me pediu isso. É voluntário da minha parte.

Ada: Prazer em agradar, né? Sem receber nada em troca. Tá ouvindo, Hugo?

Hugo: Tá notado aqui.

Kali: Ele super me desperta esse sentimento de submissão, essa vontade mesmo, né? Pra mim é uma coisa muito absurda, muito louca, tipo, dá várias telas azul em mim, e recentemente eu tô me descobrindo masoquista, além de tudo. É um dilema interno muito grande.

Eu ainda não consigo me aceitar como switcher, mas acredito que hoje em dia dá pra me definir como switcher pelo fato de eu estar me submetendo a alguém e não ter perdido o meu lado top. E o meu lado top é majoritariamente rigger, a pessoa que amarra. Eu acho que deve ser suficiente pra comunidade o fato de eu estar me submetendo a alguém hoje e permanecer como top pra me chamar de switcher, né?

O que vocês acham?

Ada: Mas eu acho que é uma questão natural de fase de transição também. Quando uma pessoa hétero, de repente, tem interesse por alguém do mesmo gênero –pra fazer uma comparação que não é igualitária, não é simétrica, mas que dá pra gente associar de certa forma – é muito comum quando isso acontece, a pessoa falar, tipo: não, eu continuo hétero, eu só sinto atração por essa pessoa, é só com ela.

Geralmente é uma fase de transição até porque toda mudança de auto-identificação gera muita dúvida, gera um pouco de...

Kali: Estresse, né?

Ada: Sim, eu até achei que você lidou muito bem com isso. Quando te deu vontade você ficou meio estranhando um, dois dias e já falou: é isso, eu quero me submeter a ele.

Porque eu acho que se eu estivesse no seu lugar eu ia ficar meses em cima daquela ideia, tipo, meu Deus, o que está acontecendo?

Até cair a ficha de que, tipo, tá, é isso que eu quero, ok. Até eu assumir pra mim mesma, sabe? Porque eu sou aquela pessoa que fica sofrendo por causa daquela ideia e racionalizando e tentando entender por muito tempo até resolver mesmo.

Aí, você não falou isso, Hugo, você não falou que é masoquista. Só pulou o assunto quando era vez dele.

Kali: Ele fugiu, né?

Ada: Ele fugiu do assunto. Jogou pra plateia.

Hugo: Eu não vou contar aqui que eu fiquei umas três semanas sem gozar.

Kali: Mereceu, aposto.

Ada: Mereceu. E eu só deixei ele gozar porque eu já tinha desistido de aplicar todas as regras, foi meio assim: não tem condição de eu deixar o Hugo gozar esse ano, se eu for justa. Porque tava muito desobediente, tava difícil.

Hugo: Mas nisso eu fui obediente, pelo menos.

Ada: Você foi. Você foi bonitinho, conseguiu ficar sem gozar, em castidade.

Kali: Uma coisa que eu não mencionei da minha relação é que ela é PPE (Partial Power Exchange), Troca de Poder Parcial. A gente tem regras que saem da masmorra, digamos assim, saem da sessão.

Por exemplo, se eu faltar à academia durante a semana, de segunda a sexta, são 20 golpes com a colher de fazer cerveja, que dói.

Ada: Que é uma colher imensa de plástico, né?

Kali: De nylon.

Ada: Nossa, dói pra caralho aquilo, gente. Puta que pariu.

Kali: Chega a tirar sangue. Ela é sinistra desse jeito. Eu tô com uma punição pendente de 75 golpes.

Hugo: Eita. Vale de calça jeans?

Kali: Não. Bundinha nua. Acho que dessa vez eu vou chorar.

Ada: [Risos] Vocês não viram, mas ela acabou de comemorar. Ai, gente, é a pessoa que tá descobrindo que é masoquista, né? Que loucura.

Hugo: É, então, eu sou masoquista, gosto de alguns tipos de humilhação. E da obediência nós estamos em trabalho, como deu pra perceber.

Ada: Acho interessante que o Hugo, e isso é legal também da gente falar nessa hora, é um tipo de masoquista bem específico. Porque normalmente quando as pessoas falam "eu sou masoquista", você pensa, ah, a pessoa gosta de apanhar, gosta de jogos de impacto, de impact play. E o Hugo gosta, só que as dores que ele mais gosta são outros tipos, né, Hugo?

Hugo: Sim, são dores de prendedores. Pressão. Com prendedores e com cordas.

Ada: Então, você não precisa gostar de todos os tipos de dores pra se dizer masoquista. O Hugo é masoquista pra caralho, mas é nessas dores específicas, né?

Kali: Ah, eu sou masoquinha baby ainda, né? A colher de cerveja eu não gosto, eu acho ela horrorosa. Flogger, que todo mundo acha de boinhas, eu acho tenebroso, horrível, quero morrer com flogger. Dores ardidas, em geral, eu quero me ver longe. Mas com mão, nossa, como é bom.

Hugo: E é barato, né?

Kali: É de graça, né?

Hugo: Aqui fazendo um pequeno disclaimer: uma pessoa que aguenta mais golpes não é melhor do que uma pessoa que aguenta menos golpes, tá? Simplesmente uma pessoa aguenta mais golpes e outra aguenta menos.

Caso você não tenha vontade de aguentar mais, tá tudo bem.

Ada: Nessa questão do masoquismo, as pessoas se comparam muito. A verdade é que você não precisa se comparar. E se alguém tentar te diminuir porque você aguenta mais ou aguenta menos do que outra pessoa, foge dessa pessoa, porque não é legal.

Cada um tem a sua tolerância, você não precisa se obrigar a aguentar um nível além do que é suportável pra você. E também, paciência é tudo, entendeu? Se você quer construir sua resistência, é possível, mas é aos poucos.

Aquela pessoa que você vê apanhando na masmorra, super pesado, com a bunda já roxa, às vezes vertendo sangue, ela não chegou naquele nível na primeira vez que ela apanhou na vida.

Hugo: Tem que ser uma vontade autêntica sua.

Kali: Verdade.

Ada: Sim, tem que ser uma vontade sua e não fazer por outra pessoa, pelo amor de Deus, que seja gostoso pra todo mundo.

Hugo: E durante o processo também.

Kali: Verdade, né? O processo tem que ser gostoso. Existem aqueles momentos em que a gente fala sobre punição e tudo mais… Mas é uma coisa combinada, não é uma parada agradável necessariamente, mas é uma coisa que é dentro do nosso tolerável. Não é uma coisa que a gente tá fazendo só porque o outro falou que tem que fazer. É uma coisa que a gente já falou: "Beleza. Isso você pode, porque eu tolero".

É claro, né? Eu não vou usar uma coisa que o sub gosta para punir ele. Não vou aplicar uma prática nele que ele gosta.

Hugo:Ué? Por que não?

Ada: Você não vai punir um masoquista batendo nele.

Hugo: Ah, sério? Por quê?

Kali: Olha, Hugo, eu vou deixar pra você imaginar o porquê.

Hugo: Ah, tá.

Ada: O Hugo é essa pessoa que ele acha que a dor que ele mais gosta é uma punição pra quando ele faz algo errado.

Hugo: Nunca entendi o contrário, mas tudo bem. E Alene, quem é você na fila do chicote?

Ada: Sou domme. Eu tenho pouco tempo de BDSM, né? Então eu também estou me descobrindo.

Eu achava, quando eu comecei, que eu era uma domme muito suave, muito boazinha. Nada sádica, entendeu? Tipo, nossa, essas pessoas ruins que provocam dor nas outras pessoas. Coitados. Oh, céus.

Mas aí eu descobri que é muito divertido provocar dor nas pessoas que gostam de dor e que às vezes parece que elas não estão gostando, mas na verdade elas tão gostando.

Então eu tô cada dia mais sádica. E eu falo que sou naturalmente caregiver. Caregiver é o top da relação de age play. Que é a pessoa que vai ser a cuidadora, né? Os títulos são geralmente mommy, daddy, tia, tio, babá. Qualquer título que denote essa função de cuidador.

Não sou uma pessoa que pratica exatamente o age play ou que tem vontade de estabelecer uma relação baseada em age play, mas eu tenho muito esse lugar da cuidadora. Então eu naturalmente cuido das pessoas que estão em volta e gosto de ter esses elementos nas minhas relações.

E quando eu interajo com bottoms de age play, littles, middles e tal, geralmente eu sou a tia deles. Mas não é uma relação que eu busco especificamente, ser mommy, não tá muito no meu hall de objetivos.

Kali: Mas é uma coisa muito engraçada, né? Porque ela fala que ela é naturalmente caregiver e ela foi eleita não oficialmente pelas pessoas do rolê BDSM aqui de Curitiba, por várias pessoas. Acho que se eu fizer uma pesquisa e colher os votos, ela ganha disparado de qualquer outra pessoa. Ela é a rainha do aftercare, né?

Basicamente, esse lado cuidador dela, ela cuida de todo mundo no rolê, seja top, seja bottom. Ela tá sempre preocupada com as pessoas ao redor porque ela tem essa natureza amável e carinhosa. Então, não é porque você é uma pessoa amável e carinhosa e querida e fofinha que você não pode ser uma domme fudidona, sádica pra um senhor caralho.

Você pode e tá tudo bem. Você não precisa sair da sua personalidade pra ser domme.

Ada: Exatamente. Se você quiser ser uma domme fofa, você pode também. Quando eu domino, eu tenho esse lado do deboche. Eu realmente tenho uma persona que fica bem claro, né?

Eu chego na masmorra, no lugar, na casa da pessoa, seja onde for, como Alene, mas aí no momento do jogo, eu entro na personagem. E eu tenho muito esse lado do deboche, da humilhação e me divirto muito. Gosto de me divertir quando eu tô fazendo cena.

Tem essa diferença, assim. Uma coisa não anula a outra e quando acabou e vai pro aftercare, eu volto a ser Alene fofinha e é isso, é divertido.

Eu nunca tive uma D/s estabelecida mesmo. Eu já cheguei a entrar em negociação e começar as primeiras fases, mas nunca tive D/s. E é isso, eu tenho alguns play partners que sei que quando a gente se encontrar novamente vamos jogar. Aquelas pessoas que você joga regularmente, né? Mas não tem nenhum tipo de compromisso, além do momento do jogo. E é isso.

Hugo: Eu só quero saber se eu chamar de tia melhora a minha situação ou piora.

Ada: Eu acho fofo quando você me chama de tia.

Kali: Dois membros. Acho fofo quando você chama ela de tia e quando você me chama de tia. É bonitinho.

Hugo: Tá bom, então vou deixar aqui anotado.

Kali: A gente sempre fala nos episódios, que a gente não tem preconceito com os fetiches alheios, né? A gente lida muito isso com aquele ditado que tem no exterior: your kink is not my kink and it's ok (Seu fetiche não é o meu fetiche e tudo bem).

Porque a gente não gosta de fazer nenhum tipo de "kink shaming", que é quando você faz tipo um bullying com a pessoa por causa dos fetiches dela.

Então, de forma alguma, a gente quer deixar alguém triste com alguma coisa, mas se a gente, por algum acaso, der uma escorregada, fala pra gente que a gente se retrata, não tem problema não.

Ada: A gente acredita muito que se você é maior de 18 e tá todo mundo consentindo e tá todo mundo se divertindo e achando aquilo bom e tem consciência disso, não cabe a ninguém achar que tal coisa é errada, é bizarra ou qualquer merda do tipo, que é esse conceito do kink shaming.

A gente é muito contra isso e espera que vocês que estão ouvindo a gente também ouçam esse episódio, os próximos e todos que vamos falar com a mente aberta pra entender que se você não gosta daquilo, tudo bem. E que outra pessoa tem direito de gostar e que todo mundo pode ser feliz sem criticar o fetiche do coleguinha.

Então, vamos lá, gente, falando de relações no BDSM. Lembrando que você não precisa, no seu objetivo final, quando você vai jogar, quando você vai começar a praticar… Muita gente chega com essa questão que, assim, eu preciso ter uma relação, eu preciso ter um dono, ou eu preciso ter um sub e isso precisa ser o grande objetivo da minha vida.

E nem sempre, né? Você pode curtir o BDSM de várias formas. Inclusive, a gente não recomenda que você tente entrar no BDSM já estabelecendo uma relação, porque às vezes você pode cair na mão de alguém que não é tão legal, você pode se privar de várias outras experiências porque você já fecha um relacionamento às pressas.

Então, isso é muito importante de pensar quando você for mesmo abordar isso e pensar o tipo de top ou o tipo de bottom que você é e o tipo de relação que você quer estabelecer, que não precisa de pressa pra nada, tudo pode ser muito bem negociado, conversado por muito tempo.

Vamos começar, neste episódio, falando sobre os tipos de relações/dinâmicas e o tipo de troca e transferência de poder.

O que é troca e transferência de poder? É a tradução de Power Exchange. Algumas pessoas traduzem como "troca de poder", outras pessoas traduzem como "transferência de poder", porque troca não tem exatamente essa denotação em português.

Kali: A troca presume que eu tô dando e você tá dando também, né? Pode ser entrega de poder, talvez.

Ada: Mas, enfim, quando a gente falar os termos troca, transferência, entrega ou qualquer coisa assim, é da ideia de Power Exchange que estamos falando. E tem várias formas disso aparecer numa relação, né?

Hugo: A primeira delas e, provavelmente, uma das mais comuns é a EPE.

Kali: Erotic Power Exchange. Que é a Troca Erótica de Poder.

Hugo: É a troca erótica de poder que você tem nas relações BDSM, essa questão da verticalidade e hierarquia, que uma pessoa tá acima, outra pessoa tá abaixo, e essa diferença de nível, essa verticalidade, só acontece durante a sessão.

Até a pessoa entrar no personagem, está horizontal, entrou no personagem, ficou vertical, só durante o ato ali. Durante o evento/sessão.

Kali: Aí a gente tem a Partial Power Exchange, PPE, que é a troca parcial de poder.

Ada: É quando tem troca de poder além da cena/sessão. Então, por exemplo, quando a Pati fala que ela tem que obedecer uma ordem de ir na academia senão ela é punida, ela tem uma PPE.

Porque se ela não obedecer naquela coisa que não tem nada a ver com cena, com sessão, que é uma coisa de dia a dia, de rotina dela, ela vai ser punida. Então, tem essa verticalidade em outros momentos também. Óbvio que são negociados e tudo mais. É o que eu estou tentando estabelecer com o Hugo, mas o Hugo é complicado, entendeu?

Kali: O Hugo não tá colaborando muito.

Ada: O Hugo não tá colaborando, mas é o que a gente tenta, tipo, exigir tarefas, exigir que faça uma coisa e não faça outra. Eu gosto muito de prática de castidade. Castidade tem que ser PPE, porque você não vai estar em sessão o tempo todo que você pede pra pessoa ficar em castidade, né? Ou algumas ordens, pequenas ordens ao longo do dia pra pessoa lembrar quem é que manda nela, esse tipo de coisa.

Hugo: Tipo dar bom dia e avisar que tomou remédio, né?

Kali: Pô, essa do remédio seria muito boa pra mim.

Ada: O Hugo faz isso comigo. Ele me obedece, quase todo dia ele lembra do bom dia e de avisar que tomou o remédio do dia. Isso é bonitinho. Muito bem, Hugo. Parabéns. Faltam as outras coisas agora.

Kali: Alguém podia sugerir essa pro dono.

Ada: Vou mandar uma listinha pra ele. Você quer que eu mande uma listinha de ideias pra ele aplicar em você? Eu tenho várias.

Kali: Uma listinha não, só essa. Eu tenho medo da sua lista. Muito medo.

Ada: Gente, eu tenho esse lado domme, que é o lado domme que quer sentir que alguém tá me obedecendo, quer sentir que eu tenho esse poder. Isso me dá tesão. Mas também me dá muito tesão mental o fato de pensar que eu tô ajudando alguém a melhorar alguma coisa da vida dela, entendeu? Ajudando a criar uma estrutura. Nossa, me dá um tesão muito louco criar estrutura pra alguém seguir. E aí a pessoa falar nossa, minha vida melhorou por causa disso. Eu fico tipo: Yes! Eu sabia. Eu sou ótima nisso.

As pessoas têm que querer também, sabe? Tipo, se você começa um relacionamento e o seu top quer mandar no seu corpo sem você ter falado o que você quer, por exemplo, o negócio da academia é um negócio que a Pati queria fazer e com essa forcinha da punição e da regra ela conseguiu cumprir muito melhor do que se ela estivesse tentando sozinha.

Kali: Realmente.

Ada: Agora, por exemplo, se ela não tivesse nenhum interesse em fazer academia ou você que não tem nenhum interesse em emagrecer e você começa a se relacionar com alguém que exige isso de você: manda à merda, pelo amor de Deus. Não continue nessa relação. Tem que ser uma coisa acordada e negociada.

Kali: Eu tenho como limite, por exemplo, ele interferir na minha depilação.

Eu acho que a minha depilação é algo muito pessoal e eu decido como é que faz. Se vier com esse papo de "ah, eu quero que você se depile de tal forma", nossa senhora, vai ouvir três dias de mim. Porque eu, além de tudo, acho isso uma coisa super machista.

Em paralelo a esses dois a gente tem a TPE (Total Power Exchange) que é a troca total de poder, que é endeusada por todo mundo. Assim, 90% das pessoas que a gente conhece acham uma TPE a coisa mais linda.

Ada: Que é tipo o objetivo final que todo mundo tinha que ir atrás. E assim, não, gente.

É uma coisa que pouquíssimas pessoas vão ter interesse real e vão conseguir levar de uma forma saudável. Porque são todas as áreas da sua vida, exceto limites rígidos, por exemplo, limites rígidos comuns nesse tipo de relação vai ser a família da pessoa ou os filhos da pessoa ou o emprego da pessoa. Se, como pessoas comuns, elas não têm condição de sustentar a outra pessoa, por exemplo.

Kali: Todas as áreas da vida, todas. Exceto o que é limite rígido, o resto está tudo sob controle. Inclusive seus limites flexíveis.

O top tem liberdade total de explorar até seus limites flexíveis. Eu não faria isso de jeito nenhum. Na minha vida isso não cabe de forma alguma.

Eu não conseguiria de forma alguma deixar tudo na mão de alguém. Porque eu preciso ter independência. Eu preciso manter alguma forma de controle sobre a minha vida.

Esses tempos atrás rolou um estresse na minha relação. O que eu fiz? Fui lá e pintei o cabelo pra retomar o controle da minha vida. Porque a gente faz essas coisas, né? Faz loucura no cabelo quando tá se sentindo fora de controle. Imagina eu não poder pintar o cabelo? Estar numa relação onde eu não posso…

Hugo: Ou que outra pessoa mexa na cor do seu cabelo que não seja você, né?

Ada: E tem muitos tops que gostam dessa dinâmica de controlar a roupa que a outra pessoa vai usar, corte de cabelo, a cor de cabelo e tudo mais. Pra Pati, por exemplo, sem condições.

Kali: Pra mim é assim, o que está dentro do meu guarda-roupa, você pode escolher o que quiser pra eu vestir. Agora, se você for acrescentar alguma coisa ao meu guarda-roupa, por gentileza observe o que já tem lá dentro. Se não fizer parte do meu estilo, eu não vou usar.

Me recuso. Porque, tipo, respeita quem eu sou, sabe? Eu tenho muito problema com a ideia da despersonalização da TPE.

Alguns tops vão fazer isso, vão transformar a pessoa, vão virar a pessoa do avesso. É que é vendida essa ideia de que a TPE 24/7 – que seria quando existe a disponibilidade 24 horas por dia, e o top tem poder de fazer o que ele quer dentro do negociado a qualquer hora do dia – tem essa ideia de que essas relações, assim, por exemplo, se você vê numa mídia, se você vê num documentário, se você vê em algum lugar e você assiste, tem a impressão de que aquelas pessoas vivem aquilo o tempo inteiro.

Tipo, elas estão acordadas e elas estão na dinâmica. Elas estão acordadas, tem alguém de joelho no chão e alguém mandando, e aí o bottom, o submisso tá sempre caladinho, tá sempre obedientezinho, tá sempre fazendo tudo. Os dois ficam dentro das personas top e bottom, dominador e submisso, deles o tempo inteiro.

Kali: Ninguém fica doente, ninguém tem cólica, ninguém tem caganeira, nada, né?

Ada: Ninguém tem dia que acorda na merda e que não quer fazer nada.

Kali: TPM…

Ada: 100% do tempo é perfeito o tempo inteiro. E assim, a gente, que conhece pessoas que têm relações assim, vemos que não funciona, não tem como ficar o tempo inteiro na persona. Você vai ficar louco.

Que horas que entra o aftercare, se você não pode sair do personagem em momento nenhum?

Uma porcentagem bem pequena de pessoas que vivem essas relações de um jeito que tá todo mundo feliz, de um jeito que é saudável e tal, mas são muito raras. Você que está entrando agora não precisa ter essa ideia de que o objetivo final, o chefão do BDSM, é você ter uma TPE 24/7 e que se você não quiser ter, você está errado. Não existe isso.

Kali: E fora que a gente não precisa estar numa TPE pra estar numa 24/7, né?

Ada: Verdade, tem isso também.

Kali: Pode ser uma TPE, a gente conhece um casal que vive muito bem, eles têm uma relação baunilha, fora a relação BD deles, moram juntos, têm uma relação super gostosa. Ela não é 100% do tempo, de forma alguma, e a relação deles é uma troca parcial de poder.

E é lindo ver os dois juntos, é lindo ver eles em cena, é lindo ver a dinâmica deles acontecendo. E ao mesmo tempo é lindo ver os dois fora da dinâmica. Você vê que é uma relação saudável, que é uma relação plena.

Então você não precisa, se você já tem uma relação pré-estabelecida e não quer entrar nessa dinâmica do 24/7 numa troca total de poder, não precisa. Não existe essa necessidade.

É muito vendido isso, né? Nos grupos e tal. Que lindo uma 24/7 com troca total de poder…

Vai ter sua relação do jeito que você quiser, vai seguindo seus passos, vai devagarzinho, começa aprendendo a fazer as práticas, depois começa a trocar poder devagarzinho. Porque o negócio é você se divertir, sentir prazer no negócio todo.

Hugo: Qual a diferença entre TPE e 24/7?

Kali: TPE é o tipo da relação mesmo, é a quantidade de poder que você tá transferindo, entregando pra outra pessoa. 24/7 é o tempo durante o qual a relação tá ocorrendo.

Ada: A disponibilidade de tempo do bottom para ser mandado. Não quer dizer que você vai mandar 24 horas por dia, 7 dias por semana, até porque você precisa dormir, precisa trabalhar, precisa fazer suas coisas. Mas é aquilo, se eu quero e não está num momento de limite rígido, posso mandar. A pessoa tá disponível pra mandar nela.

Kali: E se estiver longe, fique de olho no seu celular, né?

Ada: Sim.

Kali: Essa é a diferença. Você pode ter uma troca parcial de poder, ter várias coisas nas quais o top não vai mexer, ou que você não vai mexer no seu bottom, e vocês estão disponíveis para a relação 24 horas por dia.

O mais fácil é quando as pessoas moram juntas, mas dá pra rolar isso morando separado.

Hugo: Cuidado com pessoas que têm milhões de subs ativos assim. Porque todos esses tipos de relação demandam atenção e energia.

Ada: Dedicação, estrutura. Não é só a hora do bem bom, não. A partir de PPE e TPE precisa de mais dedicação, responsabilidade, atenção e estrutura.

Kali: Dos dois lados, inclusive. Porque a gente, geralmente, foca muito na atenção que o bottom precisa. Mas, gente, os tops também precisam de atenção.

Ada: Bom, gente, agora vamos falar um pouco das duplas, né? Tipos de relações e de dinâmicas entre pessoas que têm relações que envolvem BDSM. Começando pelo mais simples, quando falamos de EPE (Erotic Power Exchange), troca erótica de poder, aquela ideia de que você só vai ter a troca de poder no momento do jogo.

Isso é muito comum, por exemplo, em pessoas que já têm um relacionamento baunilha, descobrem o BDSM e brincam com o BDSM só dentro do quarto, por exemplo. Na vida baunilha, continua tudo como era antes. E também com o que a gente chama de play partner, que é a pessoa que tem aquela relação estabelecida, mas não tem um compromisso além do momento do jogo.

Às vezes, fora do momento do jogo as pessoas são só amigos, ou fora do momento do jogo…

Kali: São só colegas, às vezes. Você não tem uma relação mais profunda com a pessoa, porque não é obrigatório, né? Acaba acontecendo? Sim, porque o ser humano é gregário, ele vai estabelecer laços com a pessoa com quem convive bastante tempo.

Mas você pode ter aquele play partner com quem você tem uma química super legal na sessão, mas que vocês não vão pra rolê juntos, só conversam eventualmente mas vocês fazem sessões maravilhosas, e tá tudo bem.

É o equivalente da galera que eles chamam de PA, né?

Ada: Sim, PA, ou tipo, o seu ficante fixo, entendeu? Se você ficou só uma vez com a pessoa, seria a ideia de avulsa, né? Cena avulsa ou sessão avulsa. Se você já tem uma relação play partner, é assim, aquela pessoa que no baunilha seria o seu PA, ou a pessoa que é seu ficante fixo.

Se eu tô disponível e a outra pessoa tá disponível, a gente joga. Se a gente não tiver, ou se a gente começar uma relação monogâmica, fica pra próxima.

Kali: Não tem um vínculo de compromisso. A maioria das pessoas acaba sendo assim com os outros, porque, cara, se você não tiver muito empenho, você não vai entrar numa relação. E a gente tem vários tipos de relação.

A gente tem a D/s, que é uma relação de dominação e submissão. O S/M, que é sadismo e masoquismo. Rigger e Rope Bunny/modelo, que é a relação da galera que gosta de amarrar e ser amarrada.

Dono ou Handler e Pet, que é a relação da galera do Pet Play. Tamer e Brat, que é a galera da disciplina. Caregiver e Little, que é basicamente a pessoa que cuida e a pessoa que é cuidada.

Também dá pra existir, da galera da gerontofilia, o caregiver e a pessoa mais velha, onde o bottom interpreta um idoso. O DD/LJ, que geralmente é Daddy Dom e Little Girl, que é um dominador com uma personalidade mais puxada pra Daddy e o bottom é uma pessoa com personalidade mais little. Tem também o Hunter e Prey, que é o caçador e a caça do Primal.

E existem mais uma infinidade de combinações. Porque você não necessariamente vai cair só em um desses rótulos. Às vezes você vai ser um amálgama de coisas. Às vezes você não vai encaixar direito em nenhum e tá tudo bem.

Essas caixinhas não são feitas pra aprisionar as pessoas dentro. É mais pra você ter uma noção de com o que você se identifica e poder explicar pros outros como é que você joga.

Hugo: Agora vamos explicar os tipos de tops. Ou seja, aqueles que estão mandando e as diferentes formas de mandar.

Ada: Top, na verdade, é aquele termo guarda-chuva da pessoa que aplica as práticas. Normalmente está numa posição de controle e dominação, mas nem sempre.

Kali: Dominância em si do ato de dominar também pode ser incluído como prática.

Hugo: Então temos o dominador, que é aquele que gosta de mandar, controlar, delimitar. Temos o sádico, que é aquele que gosta de provocar dor e/ou sofrimento físico, moral, mental. Temos o rigger ou rope-top, que é o que amarra. É o tio do crochê, tipo a Kali.

Kali: Quê?

Ada: Tio do crochê… [Risos]

Kali: Não, Hugo, para. [Risos]

Hugo: Isso é só pra provocar pra depois, né? Enfim...

Kali: Pra depois ser disciplinado, né? Brat dos infernos.

Hugo: Então, é assim que o jogo funciona. A gravação desse podcast é uma sessão. Não sei se vocês entendem.

Ada: Pior que é. Você tá sentindo prazer com essa nossa interação, Hugo?

Hugo: O pau não tá duro, mas por pouco.

Ada: Conheço o teu tipo, tô de olho. Vai, continua.

Hugo: Aí tem o tamer.

Kali: Tamer é o top que lida com os brats. Ele é um "domador", digamos assim. O tamer é um disciplinador, é o top da disciplina. Basicamente, é o que estamos tendo que ser com você.

Hugo: Tem o tamer, que é o que lida com os brats, que é tipo o que tá rolando nesse podcast. Aí tem o dono, tutor, handler ou trainer, que é o que lida com os pets.

Já big, caregiver, mom, daddy,etc… é o que lida com os/as little ou middle. E tem o hunter, que é um caçador que caça as presas.

Agora, do lado dos bottoms, nós temos os submissos…

Kali: Mas peraí, calma tudo. O que é um bottom?

Hugo: É aquele que dá o poder, que consente e dá a liberdade, durante aquele momento de troca, para o top. E nós temos o submisso, o masoquista. O submisso, que é aquele que gosta de obedecer. O masoquista é aquele que gosta de sentir dor física, mental, humilhação e afins. O rope bunny ou modelo, que é aquele que gosta de ser amarrado.

Kali: É tu?

Hugo: Eu. Brat…

Kali: Você também.

Hugo: Brat, que é aquela pessoa que fica desobedecendo. [Risos]

Ada: Para ser punido.

Hugo: Para ser punido. O que vocês não viram acontecer aqui, porque eu sempre fui muito obediente.

Kali: Quem não te conhece, que te compre.

Hugo: Temos os pets, que são as pessoas que gostam de performar como animais. Vai da imaginação das pessoas o tipo de animais que elas querem performar.

Kali: Os mais comuns são gato, cachorro, cavalo e porquinho.

Hugo: Eu já falei com Kali, que caso um dia formos performar, já temos consentido que vai ser macaco.

E temos as littles e os middles, que são pessoas que gostam de performar como se tivessem outra idade. E aí vão desde bebês, crianças, adolescentes, pré-adolescentes e afins. E a prey, que, enfim, é a caça do caçador. E aí o trabalho dela é fugir e correr.

Kali: Ou revidar. Porque tem a vibe dessa dinâmica de caçador e presa, que você entra naquele estado de luta ou fuga. É bem legal.

Ada: Acho que aqui é legal a gente explicar melhor o que é Pet Play, Age Play e Primal Play. Porque a gente já falou bastante de dominação e submissão. Já falamos de sadismo e masoquismo. Já citamos bastante shibari.

Tamer e brat, acho que também falamos no sentido de disciplinador e disciplinado.

Kali: Bom, a gente mencionou algumas categorias dessas duplinhas de top e bottom. Por exemplo, os pets e os handlers, donos, treinadores, tutores, etc.

O Pet Play nunca vai envolver animais de verdade. É um ser humano brincando com outro ser humano. Vamos aqui usar "brincando" no sentido de "jogando", do BDSM. É uma interpretação de papéis, um roleplay. Você põe um rabinho com um pluguezinho, ou sem plugue, se você não quiser pôr plugue. Põe uma orelhinha. Ou só interpreta mesmo se você tiver afim. São duas pessoas. Uma interpretando a pessoa que cuida daquele pet e a outra interpretando o pet em si.

Pode envolver sexo? Pode. Mas se não quiser, não precisa ter.

Ada: Muitas vezes o prazer é obtido justamente com esse jogo lúdico. Às vezes pode ter elementos de humilhação também. Ou pode ser só porque a pessoa se diverte assumindo aquela persona, sem necessariamente misturar a parte sexual nesse jogo.

No Pet e no Age isso é bem comum. Muitas pessoas, não todas, jogam pela interpretação de papéis e pelo prazer de assumir aquele papel. Às vezes a pessoa, por exemplo: não quero ser humana hoje, não quero pensar, não quero verbalizar nada. Deixa eu só ser um bichinho aqui e obedecer você e tá tudo bem.

Kali: Ser cuidado, né? Uma coisa muito interessante de brincar como bottom no Pet Play, e é muito divertido, de você realmente ter essa questão de você não precisar verbalizar porque afinal, gato não fala, né?

Mas você não precisa miar, não precisa entrar 100%, mas você pode brincar, você pode ficar ali no teu canto. Às vezes você só quer sentar ali no canto e ser um gato antipático que não fala com ninguém. Você pode interagir com outros pets, é muito legal você brincar com outros pets, é muito divertido.

É uma coisa que não tem uma regra fixa, mas é muito mais fácil de entrar no espaço mental do pet se você estiver caracterizado. É incrível como estar com um rabinho ajuda muito.

Ada: Não é obrigatório, mas muitas pessoas sentem que ajuda, né? Usar orelhinhas, usar máscara… para entrar no personagem, digamos assim.

Hugo: Eu acho que essa questão de você ter um símbolo externo que pode ser, às vezes, só uma coleira, um guizo, ou uma coleira de cachorro e afins pra simbolizar um ou outro personagem, é comum em todo jogo pra início e fim de sessão. Eu gosto bastante de usar isso pra tudo, acho bem interessante mesmo.

Kali: É, eu gosto da marca do início da sessão, de colocar a coleira ou ter a coleira colocada no começo da sessão, assim, pra tipo: aqui agora é sessão.

Ada: Falamos de pet, e aí o Age vai muito nessa mesma vibe no sentido de que no Age Play geralmente o bottom vai performar uma idade diferente do que ela tem.

Kali: Mais jovem, geralmente.

Ada: Geralmente mais jovem e continuam sendo pessoas maiores de 18 anos que gostam de performar uma idade diferente e que pode ou não envolver práticas sexuais. E muita gente que gosta do Age Play, gosta do Age Play justamente por causa desse motivo que a gente tava falando do pet também, assim: não quero ser adulto mais, sabe? Deixa eu esquecer minhas funcionalidades de adulto, deixa só alguém cuidar de mim. Eu assistir desenho, pintar um livro de colorir, desenhar, comer besteira, sabe?

Tem muito esse elemento e tem muita gente que descobre um lugar de muita libertação no Age Play porque a pessoa sempre gostou de algumas coisas que são consideradas infantis, por exemplo, e descobre que é um lugar de muita paz, que deixa a pessoa muito feliz.

Isso entra nas categorias porque mesmo que a pessoa não seja nenhuma outra categoria de bottom ou de top, ela só seja little ou baby, etc, ainda existe essa coisa de ter o cuidador e de ter a troca de poder. Porque vai ter alguém que vai te dar ordem, que vai cobrar que você seja obediente, que vai te dar regras.

Kali: Vai te dar uma disciplina também, né?

Hugo: Ah, vai? Prova.

Kali: Oxe!

Ada: Oxe! Você nem é little, nem middle, nem nada, Hugo. Xiu!

Hugo: Vou calar, não.

[Risos]

Ada: Tá muito Brat hoje. Decidido.

Kali: Decidido a perturbar as ideias.

E é uma coisa, assim, vemos também muito desconhecimento no geral com a questão do primal play. Primal se traduz literalmente como "primal" ou "primitivo". Você não é um bicho, você não é qualquer outra coisa. Você é um humano, basicamente, você é um homem da caverna. Vai atacar o bottom da mesma forma que um homem da caverna atacaria uma presa.

Hugo: Do jeito que a sua imaginação permitir.

Kali: Exatamente. Eu, por exemplo, quando eu estou em primal space, que é o espaço mental que você entra quando você tá brincando de primal play – eu chamo tudo de brincando, tá, gente? Um dia vocês se acostumam com isso.

Ada: É brincar, jogar, interpretar, tá tudo nesse universo da palavra "play" do inglês.

Kali: Exatamente. Estamos lá brincando de primal e eu, por exemplo, eu rosno. Será que o, sei lá, o australopithecus rosnava? Provavelmente, né? Porque é uma comunicação primitiva. E eu fico não verbal. É assim que funciona pra mim. Cada um vai reagir de uma forma diferente.

Mas é um tipo de jogo que envolve uma pessoa que caça e a outra que é caçada. Essa é a troca de poder do primal play.

Quase ninguém conhece, a galera fala que não existe, que isso não é BDSM e eu falo: gente, deixa as pessoas, se você não tem fetiche com isso, beleza. Mas, cara, isso pra mim é uma dinâmica que me deixa extremamente excitada. Caçar alguém, uma pessoa que, voluntariamente, tá com medo de mim. Nossa, é muito legal. Eu gosto que sintam medo de mim.

Ada: E é muito divertido também… eu não faço, porque eu sou uma pessoa que não quer ficar machucada, que esse é um tipo de prática que eu top e saio machucado também. E que pode ter muitos riscos e arrebentar todas as pessoas que estão participando, né? Eu fico roxa muito fácil, eu não lido bem com dor. Então eu não me misturo, mas eu acho que é uma prática muito legal porque você não precisa de nada, né? Só precisa dos seus dentes, das suas unhas, das suas mãos e do seu instinto primitivo.

Kali: Você libera a sua fera interior.

Mas, assim, se alguém chegar pra vocês e falar "ah, isso não é BDSM", fala: vai estudar. Dá a carteirada do vai estudar.

Hugo: Aí você pede a régua, né? Me dá a régua do BDSM, por favor.

Kali: O grande livro, né? Por favor.

Ada: É, nossa, tem muita gente que fala que Age Play e Pet Play não é BDSM.

Kali: Ah, tá. Você mandar o bottom que é dog sentar, deitar, rolar, fingir de morto…

Ada: Você mandar seu little tomar banho, seu little que odeia tomar banho, você tem que obrigar a pessoa a tomar banho, enfiar ela debaixo do chuveiro porque ela não quer tomar banho, porque ela tá sendo uma criança mal educada naquele dia.

Kali: Birrenta. E daí você dá uns tapas na bunda e vai dormir com a bunda quente?

Não é, não é BDSM, não... você não disciplinou o seu bottom. Ah, vai tomar no cu...

Ada: E vamos chamar, com certeza, vários casais, várias duplinhas que a gente conhece que vivem essas dinâmicas para contar pra vocês como é o dia a dia.

Acho que isso que é muito interessante pra quem não tá inserido na comunidade, né? Fica assim: tá, eu entendo todos esses nomes, eu entendo todas essas coisas, mas como é a vida dessas pessoas? Como é o dia a dia? Como é que isso funciona?

Kali: Tem certeza que isso funciona? E funciona, gente. Funciona pra caramba.

Ada: Mas como falamos, sim, a mídia tem a tendência de mostrar de um jeito que não é. Com certeza vamos trazer gente aqui que vive o BDSM real, assim como a gente, para contar como é o dia a dia deles.

Kali: A gente não falou na hora de citar os tops e os bottoms, com relação ao voyeur e ao exibicionista. Um motivo é porque um top pode ser ao mesmo tempo voyeur e ao mesmo tempo exibicionista, e o bottom também. Não necessariamente existe a hierarquia entre voyeur e exibicionista.

Isso, normalmente, não tem relação de troca de poder nenhuma, porque às vezes você está como voyeur assistindo a cena de outras pessoas. Ou você pode fazer a pessoa com quem você tem relação se exibir pra você. Ou você pode se exibir pra pessoa com quem você tem relação. Tá tudo dentro do fetiche.

Mas o voyeurismo e o exibicionismo, que eles andam no meio de mãos dadas, o voyeur é a pessoa que gosta de observar os outros em situações sexuais. E o exibicionista é a contraparte, é a pessoa que gosta de se exibir. Mas o voyeurismo e o exibicionismo esbarram numa questão ética e de consentimento.

Por quê? Porque não é BDSM se você não tiver o consentimento de todas as partes envolvidas. Então, por exemplo, a galera que curte fazer dogging, que é fazer sexo em público, na rua, isso não é BDSM. Não é e não tem como ser. Porque as pessoas que estão passando na rua não consentiram em assistir você transar.

Se você vai numa casa BDSM e lá você está fazendo uma performance, se você tá fazendo uma apresentação de shibari, você tá fazendo uma cena pública, aí beleza, você tá se exibindo, tá top, tá sensacional. Porque as pessoas que estão ali foram lá para isso. Elas foram lá na casa sabendo que isso poderia ocorrer. Elas consentiram em estar num ambiente onde rola esse tipo de atividade. Quando você está fazendo isso sem o consentimento das outras pessoas, gente, é crime. Não pode!

Então, nada de fazer cena em público… em público. Cena em público tem que ser na casa dos seus amigos, numa baladinha de fetiche, numa casa, por exemplo, um estúdio pra isso, etc.

Ada: Em ambientes controlados, que as pessoas sabem o que vão encontrar lá dentro. Jamais para pessoas desavisadas.

E, bom, citamos vários nomes, com certeza faltou muito nome, com certeza faltou vários tipos de relação, mas é isso mesmo, é um panorama geral que estamos dando aqui. E dentro do BDSM vão ter vários termos relacionados a pessoas que têm relações comerciais que envolvem práticas BDSM, por exemplo, as pro-dommes ou dominatrix.

Quando você vê a palavra "dominatrix", é um termo que é usado para dommes profissionais, assim como o termo "pro-dommes", que são as pessoas que fazem sessões em troca de tributos.

Kali: Temos muitas pro-dommes e eu, Kali, não conheço nem nunca vi nenhum pro-dom. Mas, como tudo na vida, eu não vou dizer que não existe.

Com certeza existe e alguém deve conhecer. Então, se alguém conhece, avisa a gente pra gente conhecer, porque a gente quer conhecer também. Temos também a contraparte, que são os pro-bottoms, que é a galera que se submete, que age como bottom em troca de tributos.

Ada: Em um contexto comercial, que vão ser bem mais raros, né? Até porque pra você ser bottom de uma pessoa num contexto comercial de forma segura eu imagino que essas pessoas precisam ter toda uma rede de apoio, tem que ter alguém pra acompanhar, alguma coisa assim.

Kali: Eu conheço uma.

Hugo: Então, eu conversei com uma e ela comentou que faz a negociação normalmente, só que ela cobra pela sessão.

Ada: Mas ela não tem medo de acontecer alguma coisa com as pessoas que ela não conhece? Porque, assim...

Hugo: Aí o filtro vai na negociação.

Ada: Eu imagino que o jeito que seria seguro é você ter alguém pra acompanhar, alguém pra assistir, alguém pra ficar a postos. Nem que seja do lado de fora da porta, mas pra ficar atento a qualquer questão.

Kali: Cara, eu particularmente morro de medo, tá ligado? Mesmo fazendo sessão como top, eu morro de medo disso aí.

Hugo: E temos as findommes, que aí é um tipo particular de dominatrix. Bem controverso.

Kali: A gente tem recebido muita... Não a gente, assim, no geral do podcast, mas a gente pessoas que têm Twitter e lêem ele com uma certa frequência, têm recebido muitos tweets aleatórios de gente massacrando as findommes no Twitter. Porque, assim, muitas usam o Twitter como ferramenta, né?

Ada: Gente, findomme vai ser parte da dominação financeira. A ideia de dominação financeira existe dentro do BDSM. Pode ser uma situação em que o top cuida das finanças do bottom. Pode ser uma situação em que o top pede pras coisas serem pagas ou manda as coisas serem pagas, cobra tributos. Pode ser a situação de que...

Kali: Ou mesmo que o bottom tenha essa pira do fetiche e paga uma quantia pro top porque ele quer.

Ada: Ou dá presentes, ou pagar coisas, pode ter esse lado também de cuidar das finanças mesmo, de organizar as finanças. Ou algo como: olha só, sobrou dinheiro no mês, agora você pode me dar um presente, esse tipo de coisa.

Também tem essa questão das findommes que a gente encontra majoritariamente online, que dá essas polêmicas. Mas é que, assim, tem as pessoas que têm o fetiche em pedir e também tem a pessoa que têm o fetiche em pagar. Então, assim...

Kali: Se há oferta é porque tem demanda.

Ada: Exatamente.

Kali: E eu acho uma coisa muito chata ficar cagando regra no fetiche dos outros. O findom, que é o espectro da dominação financeira, é uma forma válida de fetiche como qualquer outra. A gente não pode dizer que ah, isso não existe, isso não é BDSM. Claro que é, gente.

Ada: Ou "coitadinho do bottom, coitadinho da pessoa que está sendo extorquida" e não sei o que. Tipo, mano, por que você está mandando dinheiro pra alguém que você não conhece? Alguma satisfação com isso você está tirando.

Kali: E se o fetiche da pessoa é justamente esse? É justamente nessa pira de se sentir extorquido? Cara, a gente não pode julgar isso.

E assim, não acho legal a maneira como algumas pessoas o fazem. A atitude de como fazem. Mas eu não posso mandar em como a pessoa se expressa.

Ada: É porque assim, tem gente pilantra nessa função que não vive nada do BDSM mas quer ganhar dinheiro fácil? Tem.

Mas tem isso em qualquer profissão, gente.

Kali: Mano, vendendo foto de podolatria. Quanta gente não viu que dá dinheiro vender foto do pezinho e não curte podolatria, não tem nada a ver. E vende um milhão de fotos do pé, e ganha uma grana lazarenta com isso.

Hugo: E aqui vale um disclaimer que, normalmente, a diferença entre uma pro-domme e uma findomme é porque a pro-domme você vai negociar como se fosse um serviço. "Quero uma sessão que tenha isso, isso e isso…" Você negocia o valor de forma antecipada e faz a sessão.

A findome, normalmente, você vai ter que dar tributos pra ela para que ela te dê atenção.

Kali: O produto que a findomme vende é a atenção dela. E a pro-domme vende a sessão dela.

E eu queria fazer um comentário à parte, assim, que eu vejo muita gente dizer:, ai, isso aí é prostituição. Como se prostituição fosse uma coisa negativa. Gente, se você considera prostituição, é prostituição. Se você não considera, não é.

Não tem problema nenhum, se prostituir não é uma coisa feia, não é uma coisa errada. O que é feio mesmo é você ficar apontando o dedo pras pessoas que fazem esse tipo de coisa e ficar julgando. Poxa.

Ada: Eu acho que podemos dizer que é uma forma de sex work, uma forma de trabalho sexual, por mais que não envolva sexo envolve essa questão do fetiche, do lugar do tesão mental e tal. Mas a gente conhece várias pro-dommes, camgirls, pessoas que trabalham com isso e que são muito felizes com isso, gostam muito do trabalho que fazem e que fazem por prazer, por vontade, por ter o fetiche mesmo.

Kali: Que foi uma escolha consciente, né? Pelo menos um exemplo que vem na minha cabeça agora, que eu sei que a pessoa tem faculdade, tem o escambal, poderia estar fazendo qualquer outra coisa, mas escolheu ser camgirl pra poder levar a vida que leva.

Ada: E porque ela adora! Se for a mesma pessoa que eu estou pensando. Tipo, ela adora, ela faz o trabalho de camgirl, é submissa na câmera, se aparece alguém que quer dominar ela, ela obedece, faz tudo que tem que fazer e tal. Goza horrores.

Kali: E se diverte um monte, né?

Ada: Ela ganha dinheiro pra gozar, entendeu? E ela é super exibicionista, então assim, é muito...

Kali: É a fome com a vontade de comer, né?

Ada: Quem é a gente pra falar que é menos, que tá errado? Que quem faz BDSM de um jeito comercial, que quem mistura dinheiro com BDSM tá errado? Jamais, gente. Curtam muito, aproveitem.

Kali: Eu acho que a pessoa está certíssima. Te faz feliz? Faz. Tá todo mundo consentindo? Tá. Só vai!

Hugo: Exato. Só tenha cuidado, né? Porque existe pilantra em todo lugar.

Kali: Fato.

Ada: Escolha bem pra quem você vai dar o seu dinheiro.

Kali: Isso aí. Se quiser dar dinheiro pra nós, a gente aceita, a gente gosta.

Ada: Quem não gosta? Então, gente, demos esse panorama de vários tipos de relações e dinâmicas dentro do BDSM, com base em práticas, com base em diferentes personas. Claro que essa lista não é abrangente, não tem tudo que é possível. É realmente um panorama geral.

E agora vamos falar de algumas questões que entram nas relações que têm elementos de D/s, dominação e submissão.

Lembrando que todas essas relações que falamos antes, elas podem ser só aquilo. Por exemplo, um sádico e um masoquista podem ter uma relação só SM, que vai ser só EPE, que vai ser só um bater e o outro apanhar. Um causar a dor, seja ela qual for e o outro receber a dor.

Mas se tem essa relação mais o elemento de D/s (dominação e submissão), pode entrar uma relação que tenha PPE, que tenha que seja PPE ou que seja TPE. Então vamos falar um pouquinho mais de algumas coisas presentes em relações que vão além do EPE.

Por exemplo, quando você vai estabelecer uma relação D/s, precisa de um bom tempo de negociação.

As pessoas normalmente não vão, e nem é recomendado, que você pule imediatamente numa situação de falar que você é dominante daquela pessoa e que ela tá encoleirada de um dia pro outro e acabou.

Geralmente tem várias fases. Por exemplo, você conhece alguém, começa a conversar, de repente vocês fazem uma sessão avulsa, ou vocês praticam em festa, e aí existe o interesse de, talvez, negociar um pouco mais pra ter uma relação além daquela avulsa. Seja pra ser play partner, seja pra estabelecer uma D/s.

E as pessoas entram aí em fase de avaliação, consideração, ou a gente fala também que aquelas pessoas estão em negociação. Elas começam a jogar com mais frequência e conversar sobre possíveis regras e negociar mais a fundo, mais detalhes mesmo do que elas topariam e do que elas não topariam numa relação pra ver se existe a compatibilidade e tudo mais pra isso realmente virar um relacionamento.

Hugo: Se fosse um relacionamento baunilha, você primeiro conhece a pessoa, esse estado que a Alene tá comentando seria aquele namoro, que você vai encontrando com a pessoa, e vai vendo se o santo bate, se a dinâmica bate de fato, e aí tem as fases, acho que quase características também de um namoro, mas no BDSM chamamos de negociação e consideração.

Ada: Tipo, esse bottom está em consideração desse top pra ver se ele vai aceitar esse bottom como posse dele.

Hugo: E a gente tem como um tipo de símbolo pra um relacionamento depois que ele passa disso, que seria equivalente a um casamento, que é a ideia da coleira.

Lembrando que BDSM, por mais que a gente brinque e jogue, não é um videogame que tem ganhador e perdedor, não se tem nenhum objetivo além da diversão dos dois. Não é que a pessoa só vai ser feliz se ela for encoleirada.

Então quando a pessoa oficializa essa relação, que seria equivalente ao casamento, a gente diz que a pessoa está encoleirada.

Ada: Quando a pessoa tem uma coleira, o bottom vai ser posse do top. E tem muita gente que vai ter fetiche na coleira, vai ter fetiche em ser propriedade, em ser posse, em pertencer a outra pessoa, que é quando entram aquelas dinâmicas que falamos lá no começo do episódio. Regras e ordens e controle que vai além daquele momento específico de sessão.

Kali: Tem muita gente que queima etapas, sai correndo, se apressa e se joga, aceita um monte de coisa e depois quebra a cara. E assim, não é nem que o top seja uma pessoa ruim nem nada, mas é muito importante você sentar, negociar bem a questão das práticas, negociar outras coisas fora as práticas se for uma PPE. Se você já está no ponto de evoluir a sua relação para uma TPE, precisa sentar e renegociar tudo.

Além de tudo, tem a questão de que, a cada sessão, vamos crescendo como top e como bottom. Quando você acabou de chegar no BDSM ou quando você está, por exemplo, que nem está acontecendo comigo, que eu estou experimentando ser bottom de verdade pela primeira vez na vida, cara, cada sessão eu descubro uma coisa nova. Então, cada sessão eu vou lá e olho de volta… a gente tem uma planilha, né?

Tem coisa que estava lá do tipo 2, meramente tolero, e virou um 4 depois de uma sessão. A gente vai desenvolvendo a relação com base na negociação e a negociação, eu digo pra vocês, do alto desses 10 anos de BD, ela não para nunca. Você vai estar sempre mudando alguma coisinha, vai estar sempre renegociando.

Ada: E se alguém te falar que você só tem direito a uma negociação ou que concordou lá no começo, acabou, você foge. Corre. Porque o consentimento tem que ser constante e a negociação tem que ser constante e todo top e todo bottom tem direito a negociação e renegociação de relação, de práticas, de tudo que for fazer.

Kali: E imagina que vida horrível em que você não pode mudar de ideia. Não dá, não tem condições.

Ada: É, eu acho que tem muito isso também quando as pessoas entram no BDSM, sabe?

Tipo, você precisa definir o que você é, define o que você é agora, definiu, pronto. Vai tatuar, escrever na pedra e acabou, não pode mais mudar de ideia. Não é assim, gente.

Kali: Eu super enxergo como uma red flag imensa, uma bandeira vermelha, sinal de alerta muito grande, uma pessoa que não deixa você renegociar as suas práticas, a sua relação. A parte da negociação é permanente. Você nunca para, nunca sai dessa fase.

E daí a pessoa começa a considerar, ela vai avaliar você, ver se é isso mesmo, se vocês encaixam bem em várias práticas. Lembrando que não vai encaixar tudo, não existe isso. Nossa, posso dizer com certeza que não existe um par perfeito.

Viu que deu um match de uns 80%, sei lá quantos por cento… Viu um match suficiente pra vocês dois, ou três, ou sei lá quantos. Você vai lá e vai assumir essa relação, o top vai encoleirar o bottom.

Ada: A coleira é tanto uma ideia física e palpável, quanto uma ideia figurada também.

Hugo: É a mudança de status, né?

Kali: No sentido figurado, da mesma forma que muita gente começa um namoro e não compra aliança de compromisso. Porque, inclusive, eu já ouvi que "coleira não pode ser limite". Gente, qualquer coisa pode ser limite.

E assim, tem pessoas que têm limite rígido com usar coleira.

Ada: Tem pessoa que não se sente confortável com nada em volta do pescoço, por exemplo. Ou se for usar coleira ela vai querer um bracelete, ou uma tornozeleira. Esse tipo de coisa. Porque a coleira não precisa ser necessariamente aquilo que você usa em volta do pescoço. É um símbolo da relação. Assim como a aliança é no baunilha.

Kali: Pode ter um pin na roupa. Qualquer coisa, gente.

Ada: Ou só que ambos sabem que um é encoleirado do outro. Você não precisa estar usando a coleira. Mas claro, tem muita gente que vai ter o fetiche de ser encoleirado, de ter uma cerimônia de encoleiramento. De ser exibido como pessoa com uma coleira oficial. De ir a eventos puxado pela guia, com orgulho de ter um dono e você ser posse daquele dono.

De exibir a coleira social em momentos baunilha. De usar aquela coleira com orgulho em todos os momentos. Geralmente as pessoas vão ter uma coleira mais chamativa pra eventos BDSM e o que a gente chama de "coleira social" para o dia a dia. Que aí pode ser um choker, pode ser um colar, uma pulseira, um pingente... As pessoas usam muito chave e cadeado, por exemplo.

Kali: A letra inicial da pessoa.

Hugo: Aqui também entra que o contrato também tem um lugar figurativo. No sentido que, como a gente coloca, que o consentimento tem que ser mantido e ele pode ser retirado a qualquer momento. Não é porque você assinou um contrato que você tem que seguir aquilo pra sempre. Você assinou aquilo com a intenção de cumprir aquelas regras. Você deu o consentimento naquele momento, mas pode retirar esse consentimento a qualquer momento e em hipótese alguma uma punição pode ser autorreferente, por exemplo: Ah, se você não aguentar isso, você vai ganhar mais. Porque isso é sinal claro de abuso.

Kali: Pra galera que não sacou a referência, algo como: "se você não aguentar os 20 golpes de cane que eu vou te dar, você vai ganhar mais 10". Não faz nem sentido.

É abuso, gente, de verdade. Se você não aguenta uma punição, usa a sua palavra de segurança e encerrou. Você já foi punido o suficiente, não precisa ser mais punido.

Ada: Tem muito isso do estado da situação mental, né? Às vezes, quando a pessoa está muito imersa, uma coisa que seria muito tranquila em momentos de jogo divertido, no momento de punição o peso é tão grande que mesmo uma coisa que a pessoa gosta pode não ser tão agradável.

Kali: Sabe o que eu percebi da minha pessoa? No momento de punição eu aguento bem mais do que num momento de jogo divertido. Porque eu tô tão decepcionada comigo mesma que eu travo os dentes e falo: foda-se, eu tenho que aguentar essa desgraça.

Ada: Tem certeza que você quer dar munição pro seu top mesmo?

Hugo: E aqui a gente tem a diferença também da punição-punição do "funishment" (combinação das palavras "fun" e "punishment").

Ada: Que é a punição divertida, punição de mentirinha, aquela punição que, assim, a gente tá fingindo que é uma punição, mas estamos fazendo porque eu gosto e porque você gosta.

Kali: Isso é legal. Eu, inclusive, como top, não suporto aplicar punição. Eu fico chateada de ter que aplicar uma punição. Eu adoro o funishment. Nossa, eu adoro um funishment.

Ada: Botar uma regrinha que você sabe que a pessoa não vai conseguir obedecer só pra dar aquela punida gostosa com aquela prática que todas as pessoas gostam.

É complicado isso de punição real, né? Nessas relações que têm esse poder, esse controle bem estabelecido e que têm regras e se a pessoa não cumpre as regras ela é punida.

Óbvio, tem regras que existem para não serem cumpridas, tem regras que são complicadas mas é aquilo assim, tipo, ah, acontece você não cumprir, né? Tipo o negócio da academia. Você preferiria ir todos os dias mas não é um problema de caráter se você não for um dia.

Agora quando é uma coisa realmente grave, uma coisa que decepciona, é uma coisa importante de errado que a pessoa fez e o outro lado, o top fica decepcionado, por exemplo, com uma atitude ou com deixar de cumprir uma regra ou aquilo vai além de só essas regras divertidas, essas regras que existem pra estabelecer uma verticalidade… no meu caso eu fico assim: não quero te punir agora, sabe? Eu tô decepcionada vamos sentar e conversar não vou descer o cacete em você porque você fez uma coisa que me decepcionou muito, tipo, não faz nem sentido. Será que eu vou ter controle emocional para aplicar essa punição de um jeito que seja justo? Tem isso, sabe?

Kali: Verdade, não tá num bom momento, né? Entra lá no que falamos sobre o consentimento, sobre jogar em estado mental alterado. Quando você está muito decepcionado com a pessoa, você está num estado mental alterado.

Ada: Ou com raiva, né? Tipo, se eu fiquei muito puta com isso que você fez, mano eu vou canalizar essa raiva que eu tô em cima de você? Não dá, isso não é saudável.

Kali: Outra coisa que não é nem um pouco saudável e vemos a galera fazendo muito por aí são os castigos de ignorar o sub. Gente, eu tenho um ódio disso, porque, cara, vocês não sabem a quantidade de trauma que vocês podem tá causando na pessoa. Os gatilhos de abandono que vocês podem tá criando nas pessoas. É muito perigoso.

Ada: Tipo, "ah, a pessoa não se comportou então vou parar de responder as mensagens, vou ignorar pra ver se ela aprende".

Mano, sério? Se for assim, seu último recurso, você tá falando assim: é o seguinte, eu vou ficar X tempo sem te responder, pra você pensar nisso que você fez. E você avisou, ok, dá pra entender, como último recurso.

Mas se você falou, se você avisou, se é só uma questão de, tipo, não gostei dessa atitude, vou ignorar vou dar um gelo, vou fazer um ghosting na pessoa… Mano, é muito filho da puta

Kali: E infantil também, né? porque é criança que faz isso. Cara, nós somos adultos jogando BDSM aqui, não somos crianças, então tem que ter noção, tem que ter responsabilidade emocional com o outro.

Quando a pessoa se entrega dessa forma pra gente, estamos numa posição de muito poder. A gente tem a capacidade de, se a gente fizer alguma cagada, acabar com o emocional da outra pessoa.Às vezes, são anos de terapia para recuperar 10% de uma cagada que a gente fez. E aí você vai lá e faz uma coisa que é sabidamente causadora de dano emocional? Isso é um red flag gigantesco.

Hugo: Por exemplo, vamos supor que aconteceu alguma coisa que de fato deixou a pessoa magoada. Tudo bem ela virar e falar: olha, aquilo que você fez me magoou vou precisar de um tempo para mim, vou ficar um tempo quieto.

Ok, foi algo sério que te magoou de fato e você precisa de um espaço e você de fato avisa o motivo e, se possível, dê um prazo e ok, se afasta. Aí são dois adultos conversando e é normal que você precise desse espaço. Mas isso se for algo grave, muito fora do normal.

Ada: Bom, gente, a gente ficou um tempão falando de top, de bottom, de top, de bottom e é claro que nesse episódio a gente também tem que mencionar ele, o "bissexual" do BDSM, que é o switcher ou switch, a pessoa que gosta de estar nos dois lados, seja com a mesma pessoa, seja com pessoas diferentes, seja no mesmo tipo de prática, seja em práticas totalmente diferentes: "como top eu gosto disso, como bottom eu gosto daquilo".

E assim como acontece com os bissexuais, tem gente que acha que o switcher não existe.

Kali: Nossa, gente… é um kink shaming muito forte, né? [Risos]

Ada: É muito forte, cara, é muito assim: "se pra mim é assim, é óbvio que pra todas as pessoas precisa ser, se eu só gosto de um dos lados, como que alguém ousa gostar dos dois?"

Primeiro que você falar que fetichista é inferior, é pior, é menor, já é ridículo e já é kink shaming também.

Kali: Porque todo BDSMer é um fetichista, pra começo de conversa.

Ada: Sim, todo BDSMer, antes de tudo, vai ser um fetichista.

Kali: Nem todo fetichista é BDSMer mas todos os BDSMers são fetichistas. Um está contido no outro. Uma coisa que eu acho muito engraçada é que a galera tem uma mania de cagar regra no switchers.

Ada: Muito, cara, é surreal. "Isso pode, isso não pode…" Gente, pelo amor de Deus.

Kali: "O switcher tem que, obrigatoriamente, performar uma prática nas duas posições"... E se eu não gosto, fi? "Um switcher tem que passar X tempo como top e X tempo como bottom" É tipo, se você está namorando um homem há 10 anos, você não é mais bissexual, sua carteirinha de bissexual é revogada. [Risos]

Ada: É muito legal que, na teoria, quando você conversa com as pessoas, elas ficam: não, nenhuma pessoa é melhor ou pior do que a outra, é só um momento de jogo…

É óbvio, né? Não existe isso, por mais que uma pessoa esteja acima e uma pessoa esteja abaixo num momento de prática ou numa relação, etc. Ninguém é melhor do que o outro, ninguém é pior do que o outro. E um só existe porque o outro existe.

Kali: Ou ainda, naquela posição de você estar ativamente humilhando a pessoa, falando que ela é um verme desprezível, saiu daquele momento de prática, é todo mundo igual.

Ada: Todo mundo igual e se não tivesse o outro lado, você não poderia praticar aquilo, entendeu?

Ninguém é melhor nem pior que o outro, mas na hora de falar de algumas expressões e de algumas questões, vemos isso embutido na linguagem das pessoas, né? Querendo dizer nas entrelinhas que um é melhor que o outro.

E assim, cara, meçam são suas palavras. Porque você só consegue ser o top dom fodão, pica das galáxias, porque existe alguém que está querendo se submeter a você, entendeu? Sem alguém se submetendo a você, você não é o top fodão das galáxias coisa nenhuma, só na sua cabeça.

Kali: Uma observação que eu tenho, do alto dos meus 10 anos no BDMS, agora que eu sou dinossaurinha. Basicamente, as pessoas que têm esse tipo de atitude não são o fodão pica das galáxias em nenhuma posição. Normalmente, as pessoas que têm esse tipo de atitude são um bando de "danette", que vivem apenas na internet e grupinhos e etc… e na vida real não é ninguém, não é conhecido no meio por ser uma pessoa mega competente, não é conhecido no meio por ser uma pessoa super razoável e querida. São só pessoas que querem cagar regras e estragar a alegria dos outros.

Ada: E que se você for cavucar e caçar histórias e tal...

Kali: Ixi, vai longe.

Hugo: E aqui, como tenho lugar de fala, eu já vi várias regras, eu, Hugo jogo com a mesma pessoa nas duas posições. Mas já vi pessoas que não gostam de misturar. Inclusive, já fiz um negócio que eu achei muito interessante, que foram três switches brincando juntos. A gente foi trocando e uma hora tinha só um submisso e dois tops.

Kali: Que massa! É tipo uma suruba BDSM, gente, que delícia.

Ada: Né? É aquelas horas que você queria ser switcher, né?

Kali: Nossa, nessas horas dá vontade.

Hugo: E aí fica aquele negócio de revanche, sabe? Uma revanche divertida. Você provocou um e provoca o outro e provoca isso… bem interessante.

Ada: Conta mais como foi essa sessão. Tinha algum gatilho pra troca? Ou era assim, tipo, "agora é minha vez" e aí as pessoas assumiam controle na força? Como que era isso?

Hugo: Tinha um pacto, assim, um olhava pro outro deu, deu, mudou, mudou e foi.

Kali: Uma sinergia, né?

Ada: Que conexão, que química!

Hugo: Dá pra brincar assim, lógico, às vezes as pessoas preferem pra não confundir e tudo mais não ter esse tipo de revanche.

Ada: Geralmente, pra quem é muito importante a coisa da obediência e da diferença de poder, né? A pessoa vai preferir fazer a sessão inteira numa posição só.

Hugo: Exato. Eu já negociei com uma pessoa que se arrependeu de dizer pra mim que foi sub uma vez, era sub antes. Aí eu fiquei tipo: mano, pra mim não faz diferença. Não vou te achar menos top porque você já foi sub. Pelo contrário.

Ada: Muito pelo contrário.

Kali: Mas tem muito disso, né? Eu já vi uma vez, num grupo de whatsapp, um cara cagando regra e ele falava que se ele soubesse que a domme tinha sido sub alguma vez na vida, ele não conseguia mais enxergar ela como domme. Ele diz que via ela apenas como mais uma sub que não sabia o que queria.

Ada: Que absurdo, que absurdo.

Kali: A pessoa falou isso logo depois que eu tinha dado minha apresentação naquele grupo. E uma pessoa que me conhecia na época que eu tava entrando no BD falou assim: mas pô, Kali, você não era sub? Não, não era. Eu tava tentando ser, mas não rolou.

Aí a pessoa desagradável lançou esse comentário "nossa, essas dommes que não sabem o que querem falsas dommes. Daí eu disse: falsa porque, filho? E eu nem tinha me apresentado como domme, me apresentei como Rigger. Meu principal é ser Rigger, sempre foi.

Aí o ser humaninho disse: "não sei o que, porque essas dommes fake que se apresentam como domme mas já foram sub…" Tinha umas 30 switcher no grupo e todo mundo caiu em cima dele: eu sou switcher, e aí? Eu quando quero me submeto, quando eu quero eu domino, e aí? Grandes bostas, e você quem é?

Depois a gente foi descobrir que o cara nunca tinha feito sessão na vida.

Ada: A pessoa só tem a ideia preconcebida, preconceituosa, e acabou.

Kali: "Eu tenho 8 anos de BDSM"... Nunca fez sessão na vida, só sessão virtual. Ah, para!

Hugo: É engraçado que eu daria uma resposta pra sessão virtual pré-pandemia, mas pós-pandemia é…

Kali: É o que tá tendo, né?

Ada: Mas é complicado. Pra quem já viveu o BDSM real, fazer o BDSM online…

Kali: Mas aí entra um outro ponto. Pra quem já viveu o BDSM real, eu enxergo como estar fazendo dinâmicas ali que você já testou na vida real, tá emulando elas pro virtual. Está trazendo do real para o virtual e não o contrário. Você não tá fazendo uma coisa puramente virtual que não existe e, tipo, se achando o pica das galáxias.

Por exemplo, você está sofrendo pra dominar o Hugo porque ele não obedece.

Ada: E se ele estivesse aqui, eu estaria de olho nele.

Kali: Iria castigar ele de gaiolinha. Acabou. Não ia ter essa de "vou gozar", não vai, não vai gozar porra nenhuma.

Hugo: Só em minha defesa, eu me mantive casto, tá?

Ada: A castidade ele obedeceu certinho.

Hugo: O que eu não fiz foram outras coisas.

Kali: Iria ficar casto até o Natal.

Hugo: Só até o Natal? Páscoa, talvez. [Risos]

Ada: Hugo, você sente prazer sendo elfo doméstico? Não também, é só porque você sabe que vai ter recompensa de sessão.

Hugo: Isso.

Ada: Pelo menos você obedece, você limpa a casa.

Kali: Ele limpa direitinho pra caralho. Ele e a Marie Kondo tão assim ó.

Ada: Olha que arraso. Essa parte eu quero.

Kali: Ele é muito organizado.

Ada: Mas é muito assim: "vai ter sessão mais tarde então vale a pena o esforço".

Hugo: Exatamente.

Ada: Ele só funciona na base da recompensa. Não é nada só porque eu vou agradar a minha domme. É tipo: o que eu ganho com isso?

Kali: Reforço positivo, gente! [Risos]

Hugo: Enfim… [Risos]

Ada: Fala mais um pouco de como é ser switcher pra você. Acho que a gente tem que reforçar esse negócio de que o switcher existe.

A gente tem até conhecidos que são casais de switchers. E que conforme o humor que eles estão naquele dia, naquela semana eles trocam quem tá mandando, sabe? Numa hora é um que controla a cena a sessão, no outro momento é outro. Às vezes eles alternam no meio do rolê… e são muito felizes com isso.

Existem muitos casais de switchers que funcionam muito bem com os dois exercendo os dois papéis com o companheiro e tá tudo bem.

Kali: Eu vejo que a relação de dois switchers pode muito bem ser negociada da mesma forma que a relação entre um top e um bottom. A única coisa que a gente tem que ter cuidado quando são dois switchers que estão negociando, é lembrar que você não tá negociando só como top ou só como bottom você tá negociando como os dois.

Hugo: Ou deixar claro que você tá negociando só como bottom ou só como top pra aquela pessoa. Igual essa menina que eu levei, eu falei pra ela: eu sou switcher, mas tô procurando uma pessoa só pra dominar. Pode ser que em algum momento eu deixe você me dominar, e foi o que rolou rolou ali, mas normalmente só eu dominava ela. Eu busco mais dommes do que busco subs.

Ada: Mas é porque você gosta mais ou porque é mais fácil de achar?

Hugo: Acho que é porque eu gosto mais.

Ada: Você gosta mais de só ficar lá de boinha e alguém fazer as coisas com você?

Hugo: É, tipo isso.

Ada: Uma amiga minha, a gente bolou uma cena… ela tava fora do Brasil e ela estava voltando. Aí eu comentei com ela, falei: nossa quando a gente se encontrar a gente tem que passar aquela cena, ver como é que faz, nossa eu nem lembro mais como é que era, vou ter que estudar, vou ter que ler minhas anotações para lembrar o que a gente tinha bolado, né?

Aí ela disse: "ah, essa que é a parte boa de quando a gente é bottom, porque não precisa pensar em nada. É você quem vai ter que estudar, organizar, controlar, pensar no que vai fazer… eu só vou estar lá aproveitando".

Kali: Nossa, mano, eu tô muito vendo isso agora. Porque quando eu vou amarrar alguém, por exemplo, vou fazer uma suspensão, eu tenho que pensar sobre o tipo de corpo da pessoa, o peso, a altura, como o corpo dela se comporta, por exemplo, se tem uma tendinite, se tem alguma coisa.

Tenho que pensar num monte de variáveis como é que eu posso deixar aquilo menos desafiador pra pessoa, porque suspensões são difíceis de suportar, fazer toda uma engenharia, e na hora eu tenho toda uma questão de protocolo de checagem ver como é que tá a saúde da pessoa durante a suspensão… é um mil coisas, eu tenho que estar mega focada.

Quando eu estou em sessão como bottom, eu estou meramente existindo. Estou preocupada com "o que raios ele vai fazer agora? Ai, dói" é só isso. É muito mais fácil. Claro que você fica lá, tipo, queria tanto fazer X, queria tanto fazer Y, aí você pede e você ouve: "não".

Ada: O desafio é tentar não fazer o que vamos falar aqui agora, que é o que? O topping from the bottom, que é uma expressão que vai ter mais de uma concepção, tá? Quando você fala "topping from the bottom" ou "dominação por baixo" a primeira ideia que vem na cabeça das pessoas é justamente essa coisa super negativa do bottom que quer mandar ou manipular o top pra fazer o que ele quer.

Kali: É aquela coisa, isso não necessariamente é uma coisa negativa. Porque existe um tipo de top que sobrevive disso, né? Que é o service top. O que seria do service top sem um bottom tipo o Hugo, que se autodomina? [Risos]

Ada: Que sabe exatamente o que quer: olha, deixa eu te dar aqui a minha agenda, meu cronograma, minha lista…

Kali: "Esse é meu manual de instruções, é assim que eu funciono na sessão." Tem aquela coisa, por exemplo, na minha dinâmica tem coisas que eu posso pedir quantas vezes for, não vai rolar. Às vezes ele cede, porque ele quer fazer, e às vezes não. Não dá pra mandar por baixo.

Ada: Eu sou essa pessoa que pode até ser uma coisa que eu tô querendo fazer, mas se a pessoa vem num tonzinho de "faz isso comigo agora, você não vai fazer isso comigo agora?" Tá querendo mandar no fluxo que vai ter, no jeito que vai ter… Não tô falando que você faz isso, mas eu sou aquela pessoa que mesmo que eu queira fazer, se a pessoa vem me dar uma "sugestão" muito detalhada ou tá querendo sugestionar demais pra eu fazer exatamente o que ela tá querendo, eu fico: não, vamos fazer outra coisa, acho que essa ideia não é muito boa…

Óbvio que eu vou anotar no caderninho e penso que se a pessoa gosta daquilo é uma opção pra eu fazer com ela, não vou privá-la.

Kali: Como prêmio, às vezes, né?

Ada: Como prêmio… Não vou privá-la das coisas que ela gosta. Mas, assim, agora não vai rolar, pode ser outro dia.

Kali: E se a pessoa implorar pra você?

Ada: Então… aí eu gosto. Eu falo, tipo: você quer mesmo? Tipo o negócio da castidade…

O que você quer falar, Hugo? Deixa eu falar sobre implorar primeiro? Ou você quer falar alguma coisa?

Hugo: Não, eu só ia falar que tá anotado aqui. E uma coisa que a dominadora pode fazer é pedir sugestões, opções, pra pessoa que está sendo submetida e fazer alguma das coisas sugeridas ou não.

Ada: Já aconteceu também de eu falar, tipo escolhe um entre um, dois e três, né? Já fiz isso com você uma vez, né?

Hugo: Sim.

Ada: Comunicação é crucial, então tudo bem você comunicar o que você gosta, o que você não gosta, falar coisas que você gostaria e tal… Esse é o topping from the bottom positivo, o bottom que sabe o que quer e que comunica o que quer de uma forma legal, de uma forma que vai ser bem recebido pelo top. E se o top é aquele que vai ser mais malvadinho, mais "não quero te dar exatamente o que você quer na hora que você quer" ele vai saber que você quer e vai ter isso como opção pro futuro.

Kali: Faz parte da condução da sessão, né? Faz parte do estilo do top, da maneira dele conduzir. Ele pode chegar e falar "não" e dali a 5 minutos fazer. Como ele pode falar "não" e você ficar tipo: mas eu queria tanto…

E tudo bem, os dois estão certos. A grande diferença que eu enxergo é que quando você comunica aquilo que você quer, aquilo que você gosta, aquilo que você espera, isso faz parte do que a gente tava falando sobre negociação. Você tá negociando a relação o tempo todo. O BDSM é uma grandíssima DR interminável, e não é uma DR ruim, é uma DR boa.

Se você não falar, cara, sério eu não tenho bola de cristal, não tenho como saber o que um bottom meu vai querer.

Ada: E, gente, jamais comunicar o que você gosta e comunicar as suas necessidades e conversar sobre isso vai ser uma coisa negativa. Tudo bem você falar das coisas que você gosta, tudo bem você pedir coisas. O que é visto como negativo é a questão do tipo "faz isso em mim agora, poxa, você não vai fazer? Não vai fazer mesmo?" Insiste até a pessoa desistir, vence pelo cansaço, ou tenta manipular pra conseguir o que quer.

Mas se você já toma uma atitude de, por exemplo, implorar no sentido de, a pessoa falou não, 3, 4 vezes e não é não, e acabou, e você aceita que mesmo implorando não rolou, beleza. Agora, se você tem esse ponto de vista de querer manipular a todo custo e conseguir o que você quer, isso não é ser submisso.

Você está ali aceitando que a outra pessoa tem o poder e que por mais que você tenha as vontades, quando você aceitou aquela relação, aquela dinâmica, você aceita que a pessoa vai saber o que é melhor pra você naquela hora. Eu tenho muito isso de gostar de fazer o bottom exercer a paciência dele. Paciência é uma coisa muito preciosa, as pessoas precisam aprender a ser mais pacientes e esperar um momento pra receber o que querem.

Kali: Eu enxergo muito essa questão da manipulação como essa pessoa que está tentando manipular a outra não tinha nem que estar no BDSM. Porque manipulação fere o consentimento. Se você precisa manipular alguém pra pessoa fazer o que você quer… porra, cara, tem tantas formas mais fáceis. A gente acabou de falar sobre a galera que faz o rolê profissional, você quer uma pessoa que vai fazer exatamente o que você quer? Contrata uma pro-domme, vai viver teu fetiche de maneira segura, de maneira profissional, não fica enchendo o saco de uma pessoa que também está querendo viver o fetiche dela de boas.

Ada: Ela não está ali só pra te servir, ela quer atender o fetiche dela também. São as duas partes. Ela não vai só negar as coisas que você quer, mas se você quer alguém que só te dá o que você quer…

Kali: Arranja um sub!

Ada: Arranja um sub pra fazer o que você quer, exatamente, é o sub que faz o que você quer e não o top.

Aí tem essas concepções do topping from the bottom, né? E também vai ter a ideia de a pessoa que está sendo bottom numa cena, mas está mandando… tipo, sou domme mas estou bottom porque estou recebendo uma massagem, por exemplo, ou porque mandei meu sub pingar vela em mim porque acho vela relaxante…

Kali: Eu gosto daquelas velas de massagem, aquilo é extremamente relaxante.

Ada: Mas isso é uma concepção por causa do que as palavras top e bottom significam. O fato de ser alguém que está exercendo a ação e alguém recebendo a ação.

Kali: Eu sempre falo que top é quem dá a ordem e/ou aplica a prática.

Ada: Essa é uma boa definição.

Kali: Se você deu a ordem, o outro continua sendo o bottom, porque ele está executando a ordem, não interessa o que ele está fazendo, ele está obedecendo. Se eu mandei, eu sou o top.

Hugo: Nossa, um dia eu vou mandar alguém colocar prendedores em mim.

Ada: Exatamente, vai estar sendo o top da cena. É basicamente isso. Eu acho que o Hugo, na verdade, é só top, entendeu? Mas ele é um top masoquista talvez.

Hugo: Vou levar isso para a análise.

Ada: Pela minha concepção, óbvio, eu não vou mandar na sua autodefinição porque quem manda nisso é você. Mas talvez você seja ou brat, ou só um top masoquista que ainda não conseguiu aplicar isso.

Hugo: Olha só que divertido.

Ada: Você está aí buscando dommes, mas na verdade o que você precisa são de subs que façam o que você quer para você sentir o prazer que você sente.

Hugo: Vou botar no caderninho e vamos conversando sobre isso.

Ada: Olha só, estou te proporcionando novas descobertas aqui. Olha como eu sou uma pessoa maravilhosa.

Hugo: Ao vivo!

Kali: Mas é muito legal, isso que você fala é bem a outra coisa que a gente queria falar. É possível você ser uma combinação de categorias sem necessariamente ser switcher.

Ada: Sim, exatamente! Pode ser que o Hugo seja um switcher normal, gosta de práticas de um lado e gosta de práticas do outro lado. Mas pode ser que ele descubra, como nós temos pelo menos dois amigos que são, um top que também é masoquista. Então pode entrar na dinâmica de um top que é masoquista dar ordem para um sub causar dor nele/nela.

Kali: Por exemplo, quando a minha little vem, quando a minha little aparece ela é uma lazarenta de uma pentelha mandona. Porque ela é a princesinha do rolê, ela é top, acabou. Quando eu entro em little space é 100% top, cuide de mim porque eu mereço ser cuidada, me dá danoninho, ah não vai me dar danoninho? Eu vou buscar aquele negócio lá de estrelinha e vou bater em você com ele.

Hugo: Aquele da Decathlon?

Kali: Esse mesmo. Ela já falou exatamente essa frase.

Ada: Esses dias eu ouvi um podcast de uma domme gringa em que ela se definia como princesinha sádica. E é exatamente isso, ela disse que as cenas dela eram sempre muito divertidas, com muitos elementos de little, e quando ela entrou no BDSM – como ela sabia que ela era little, ela achava que tinha que ser sub, que ela tinha que ser bottom – e aí ela não conseguia se identificar com aquilo até que ela viu uma domme jogando e ela ficou tipo, cara é isso. Só que eu sou little, não vou deixar de ser little, como é que eu faço isso? E aí ela descobriu que podia ser os dois.

Então, por exemplo, ela disse que uma das cenas que ela fazia era botar um bottom de chapéuzinho de unicórnio e botar todas as crianças pra jogar argola no chifre acertar o chifre e é claro que se por acaso ela e os outros littles não acertassem a argola a culpa era do bottom, que a culpa é sempre do bottom e era ele que apanhava. E esse tipo de coisa, coisas do universo infantil, mas com um toque sádico.

Kali: A hora que você falou, eu já pensei nela andando nas costas dele, ele andando de quatro no chão. Eu super faria isso. Cavalinho, unicórnio! Tão delícia, super quero.

Hugo: Pois é, pessoal. Com essa imagem fofa, nós ficamos por aqui?

Ada: Acho que é isso por hoje. Falamos muito, só pra vocês saberem a nossa gravação tá em duas horas e cinquenta e três, eu espero que quando vocês estejam ouvindo isso esteja no máximo com uma hora e quarenta, mas talvez não… É muito conteúdo, não dá pra garantir.

Mas eu tenho certeza que quem tá ouvindo está se divertindo, porque hoje o papo foi muito bom, muito divertido. Espero que a gente tenha esclarecido tudo que falamos também, porque, sinceramente, a gente tá se divertindo tanto que eu tô em dúvida se a gente realmente falou de tudo que precisava falar hoje.

Kali: Acho que falou sim. A gente até se alongou demais em algumas explicações tudo… Mas eu acho que valeu a pena.

Hugo: Se você ainda está "nossa, é muito nome, é muita coisa…" de fato é. Principalmente pra quem é novato. A partir do próximo episódio vamos começar a contar as nossas histórias, dissecar mais práticas, e a ideia é que tudo fique mais claro. Mas primeiro a gente precisava desses três episódios pra poder começar a descrever melhor o nosso jogo e como é a nossa brincadeira, como as coisas funcionam pra gente e como a gente pensa. Se você acompanhou até aqui, não esqueça de curtir e compartilhar, se inscreva… não, pera.

Ada: Nossa, Hugo, como você tava falando bonito. Eu fiquei até excitada aqui. Meu Deus.

Kali: Tava mesmo. Hugo, na moral, você fica muito sexy falando bonito assim.

Ada: Fale bonito mais vezes pra gente ver.

Hugo: Sigam a gente no seu agregador de podcast favorito, deixe seu comentário, mande mensagens pra nós, nós gostamos. E se quiser deixar qualquer coisa que você achou que a gente errou, queira complementar, mande pra nós e avise se quer ser citado como anônimo ou não e podemos trazer isso em nosso quadro de erratas e complementos, beijos, abraços, chicotes, tapas… Então, até mais, beijo.

Ada: Com o fim da nossa sessão, chegou a hora do aftercare. Qual vai ser o aftercare de vocês hoje?

Hugo: Eu vou comer meu sanduíche, que acabou de chegar. E tenho uma tarefa da minha domme maravilhosa.

Ada: Vai obedecer a sua domme hoje, pra variar um pouco?

Hugo: Não sei, será que ela merece.

Ada: Você teve a ousadia de falar isso? Cara, mas ele tem muita sorte de estar no interior da porra do nordeste, né? Olha, no dia que eu pegar pra cobrar essa dívida…

Kali: Haja couro, hein?

Ada: E qual vai ser o seu aftercare, amiga?

Kali: Eu vou ter que ir pra casa, continuar o inferno da minha mudança. Eu deixei tudo jogado na mesa de centro, não deu tempo de arrumar nada. Estou toda atrasada com essa mudança, então eu vou basicamente limpar blackout, botar cortinas pra lavar, pendurar os bendito dos varão… [Risos]

Ada: Eu vou fazer uma comidinha, jantar, e talvez assistir alguma coisa. Gente, bom aftercare pra vocês. Esse foi o espetáculo de hoje. Beijos, gente!

Verbete

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