
No episódio 4 do Chicotadas, chegou a hora de aprofundarmos o que falamos lá no nosso piloto e de vocês conhecerem a gente melhor! Nossa equipe conversa sobre nossa vida baunilha e fetichista, a jornada de descoberta e primeiras experiências no universo BDSM de cada um e a história da nossa amizade. Também falamos sobre nossa personalidade como praticantes: fizemos um top 5 de nossas práticas/fetiches preferidos, citamos limites e metas na vida BDSM e também contamos o que aprendemos com o BDSM e qual conselho gostaríamos de ter recebido na época em que iniciamos.
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Hugo: Atenção: esse conteúdo é produzido por adultos, para adultos, e não deve ser consumido por menores. Se você ainda não tem 18 anos, nós não damos o nosso consentimento para que você continue escutando.
Ada: Aqui é a Alene, ou Ada, mulher cis, demissexual, domme, e hoje a minha frase de segurança é "É hoje que vocês confirmam que a gente é só um bando de nerd safado". [Risos]
Hugo: Oi, meu nome é Hugo, sou homem hétero cis, switcher, e tenho limite rígido com festa de fim de ano durante covid.
Ada: Muito bom, ótimo limite rígido. Excelente.
Kali: Oi, eu sou a Kali, demigirl, omnissexual, top, e hoje a minha palavra de segurança é "currículo". Vocês já vão saber porquê.
[Risos]
Hugo: Olha os mistérios aí no ar.
Kali: Gosto.
Ada: E eu não quero ser a única admitindo que é nerd aqui nesse ambiente, hein! Somos todos.
Hugo: Somos todos nerds.
Kali: Eu sou muito nerd.
[som de chicote] Você está ouvindo o Chicotadas, um podcast entre tapas e cuidados, e demais gostos peculiares pelos quais você talvez se interessaria. Aqui nós vamos conversar sobre BDSM, sexualidade, não monogamia, poliamor e estilos de vida alternativos.
Ada: Este podcast é produzido por três amigos praticantes e membros ativos da comunidade BDSM, com diferentes gostos, anos de estrada e experiências. E a gente espera que você goste de nos ouvir e debater conosco sobre esse universo tão vasto e excitante.
Oi, gente, boas-vindas ao episódio 4. Esse episódio aqui vai ser o "Nossa Jornada no BDSM". E nossa equipe do Chicotadas, que sou eu, Alene, a Kali e o Hugo. Vamos contar um pouquinho pra vocês da gente, da nossa vida baunilha, da nossa amizade, da nossa vida kinky, como a gente descobriu o BDSM, nossa jornada nesse meio, o que a gente gosta, o que a gente não gosta… e um pouco mais das nossas vivências nesse universo. Pra vocês terem noção, saberem nos próximos episódios de que lugar que estamos partindo.
Kali: Quem é a gente e por que estamos com essas vivências. De onde vem essa experiência que a gente discute tanto aqui.
Ada: Sim, sim.
Hugo: Deixa eu começar, então. A Alene falou pra gente se assumir como nerd. Mas acho que tenho o emprego mais nerd dos três. Atualmente estou estudando programação na Trybe, para ser webdesigner.
Kali: Garotinho de programa.
Hugo: Um garotinho de programa. [Risos]
Ada: Ele é do TI. E TI que é uma das profissões mais comuns no BDSM, né? Tem muita gente de TI e advogado. São os que mais tem, eu acho.
Hugo: Não tenho fetiche em formatar computador, mas se você quiser a gente pode fazer aquelas trocas lá. Então, vamos de história.
O pequeno Hugo nasceu "no interior do interior" e sempre foi muito acostumado com tecnologia. Eu já morei tanto no interior quanto em Brasília e em Curitiba, onde eu conheci essas duas figuras raras aí, que ficam no meu coração. Sobre signos, eu já comentei, sou de Peixes, hétero…
Ada: Você sabe seu ascendente e sua lua, Hugo?
Hugo: Isso tem na nossa conversa, mas eu não lembro mais.
Ada: Você precisa melhorar isso, precisa saber de cor.
Hugo: Infelizmente, devido à Trybe, eu tô sem tempo pra estar distribuindo o currículo da minha bunda. Mas assim que disponível, a gente volta a ofertá-la novamente. E aí eu relembro essas informações.
Então, essa criatura aqui com 29 anos, vai fazer 30 no ano que vem, se o ano valer. Eu sou um cara que gosta de esportes, acho que se você me visse na rua eu seria um nerd. Ou estaria, sei lá, pedalando, correndo, fazendo atividade física. Modéstia às favas, estou começando a ficar bombadinho, talvez a Alene deixe de gostar de mim.
Ada: Tá, ele tá uma delicinha. Eu fico muito dividida, porque parte de mim fica assim, tipo, nossa, o Hugo tá ficando uma delícia. Mas outra parte de mim fica assim: mas ele sempre foi uma delícia. Eu curto magrelinho também. Agora ele tá saindo do magrelinho e indo pro bombadinho. Gostamos.
Kali: Olha, gostamos. Eu, particularmente, gosto dos dois, mas prefiro mais recheadinho.
Ada: É que tenho a coisa pelo magrelo, né? O tipo magrelo é um dos meus tipos preferidos. Mas eu não faço diferença de tipo de corpo, não. Tendo um corpo pra gente usar tá ótimo! E o Hugo tá ainda mais gostoso, porque essa raba sempre foi uma delícia.
Kali: Isso, exatamente. Eu queria fazer uma menção honrosa à raba do Hugo, que é espetacular. Sempre foi e sempre será.
Hugo: E aqui fica como testamento que, quando eu falecer, o caixão tem que ser com o tampo de baixo em acrílico. E eu estar, logicamente, só com a parte de cima da roupa. E o local preparado para que no piso inferior as pessoas se despeçam da minha bunda e na parte superior as pessoas se despeçam da minha carinha.
Ada: Muito bom, porque precisa de um funeral pra essa raba.
Kali: Nossa, certeza. Caixão de acrílico, eu apoio. Vai ser o belo adormecido... o belo falecido.
[Risos]
Ada: Tá registrado, tá gravado o pedido pro seu funeral.
Kali: Ô, Hugo, você de terno, hein? Que delícia.
Hugo: Vocês nunca viram? Tenho que usar mais terno.
Ada: Nossa, esse ombrão que ele tá agora de terno, meu Deus.
Kali: Na moral, camisa e daí dobra a manga, sabe? Nossa, cara! Desculpa, fetichei o amiguinho.
Hugo: Quando criança – tenho uma família grande – brincava muito de polícia e ladrão. E nisso eu gostei/descobri, eu gostava de ser ladrão e ser amarrado pela polícia. Tentava repetir isso de várias formas e com algumas manipulações de criança em cima das outras crianças. Tentando fazer isso de aposta, alguma coisa nesse sentido. E assim ia enchendo o saco dos outros e tudo mais.
E só depois que eu fui… já tinha a internet discada em casa. Aí eu usava o Cadê pra pesquisar lá: "mulheres amarradas". E daí eu descobri que tinha um nome em inglês que aparecia muito mais fotos de mulher amarrada. Aí eu copiava e colava esse nome e tinha bastante coisa lá. Então essa minha jornada começou por aí. Depois, eu fui tentando entender o que era, via que outras letras apareciam junto com aquelas fotos. Entre elas, essa sigla muito famosa. E aí a gente começa a ler, começa a entender. Mas acho que eu fui muito mais atraído por esse lugar. E daí começou tudo, comecei a descobrir que existem pessoas no Brasil que fazem isso.
E aqui eu deixo o meu grande abraço e beijo ao Algemadas, que na época era um Fotolog. Pra vocês verem como eu sou velho, isso aí tá antes do Orkut, pras crianças que não sabem a cronologia das coisas.
Então tem o Fotolog Algemadas, que aí eu conversei com um cara e aí descobri que outras pessoas faziam. Daí eu vou ver grupos, nisso eu já morava em Brasília. E aí que eu entrei em contato com a Vaca Profana, que tá na ativa até hoje. E aí tenho esses e-mails registrados. Que, vamos dizer assim, são meus primeiros dias de BDSM real. São essas trocas de e-mails com ela. Apesar de eu não ter ido em nenhuma festa em Brasília. Porque eu não tinha carro, eu morava com a tia e tinha que justificar pra onde estava indo e era meio complicado assim. Então esse foi meu start.
Por motivos pessoais, boa parte da minha família não faz noção. Meus amigos, sim. Mas é bem curioso isso. Por isso eu mantenho a minha cidade e meu sobrenome escondidos e tenho dois perfis nas redes. É o pessoal do interior, conservador, aquelas coisas todas. Não entenderiam como a gente pensa e o que a gente pensa. Faz parte da vida e eu entendo e respeito eles. Não quero gerar mais esse conflito.
Ada: Mas você acha que se vazasse seria um problema pra você? É porque é mais confortável ficar no armário? Ou você acha que teria algum perigo se você saísse do armário na questão do BDSM?
Hugo: Tem uma dúvida que eles mais ou menos desconfiam. Porque de vez em quando eu deixo uma corda por aí, um troço por aí. Mas, na dúvida, vamos manter assim, ninguém sabe de nada…
Kali: Eles fingem que não sabem, você finge que eles não sabem e tá tudo certo.
Hugo: E tá tudo certo. Sem grandes perguntas, sem deixar marcas em lugares visíveis quando vou chegar. Essas coisas básicas. E acho que é isso. Eu tô virando um desenvolvedor web. Fiz engenharia civil na Federal do Paraná.
Ada: É verdade. Que você morava em Brasília, não foi em festa lá porque morava com a tia. E você veio fazer faculdade em Curitiba.
Hugo: Fui fazer faculdade em Curitiba e lá que comecei, tive minhas sessões e minhas parcerias. Conheci mais o meio e tudo mais. E já adianto que é difícil você ver um histórico linear no BDSM. Você pega o histórico da pessoa e sobe e desce, sobe e desce. O meu é assim, mas vou contar isso mais pra frente.
Kali: O Hugo já falou um pouco dele, eu vou falar um pouquinho sobre mim. Eu vou tentar não me alongar, gente, porque eu sou geminiana. Como toda boa geminiana, eu não calo a porra da boca. Meu nome baunilha é Patrícia e o meu apelido no BDSM é Kali. Eu sou de Curitiba, mas um pedaço do meu coração mora em São Paulo. Porque tenho muitos amigos em São Paulo, muita gente querida.
Eu sou demigirl. Meu gênero é o de uma pessoa que foi designada mulher ao nascer, mas eu não me sinto mulher o tempo todo. Tem alguns momentos em que eu não sei o que eu me sinto. Daí eu expresso isso no meu vestuário, na minha aparência. Aí eu brinco que eu tô meio piazinho. Mas eu não chego a me sentir homem em momento algum.
Eu sou omnissexual, essa é minha orientação sexual. O que é uma pessoa omnissexual? É uma pessoa que tem atração sexual por pessoas de todos os gêneros e leva em consideração a expressão de gênero da pessoa. Não é que nem o pansexual, que tanto faz a expressão de gênero da pessoa. Na verdade, eu levo muito em consideração porque faz parte do que faz a pessoa atrativa pra mim. Atualmente, estou solteira e aceitando currículo para bottoms. É por isso que a minha palavra de segurança hoje é "currículo". Estou aceitando. Manda no inbox do Instagram.
Eu sou top. Passei por um período agora, vocês devem ter acompanhado nos últimos episódios, onde eu estava me submetendo e gostando de me submeter. Mas, infelizmente, a relação não continuou. E eu não pretendo me submeter a mais ninguém. Não vou cuspir pra cima e dizer que isso nunca vai acontecer. Mas eu não pretendo. Então, se vier com papinho de "ah, eu vou mandar currículo, mas eu quero ser seu top". Não.
Como eu falei, eu sou geminiana. Falo muito, muito. Pra quem gosta de saber dessas coisas e tal. Tenho ascendente em virgem, acho que vem daí o meu gosto pelo controle. Tenho lua em sagitário. Tudo que o meu mapa astral não cobre, porque, cara, eu sou muito o meu mapa astral, os meus orixás cobrem.
Eu sou umbandista desde 2012. Eu lembro que teve eleição em 2012, teve a eleição no domingo e no sábado foi a primeira vez que eu pisei num terreiro. Foi o Magia dos Ciganos. Foi a coisa mais maravilhosa da minha vida. Tô na umbanda até hoje. Eu sou filha de Ogum com Iansã. A galera que manja dos orixás já deve ter pensado: Vish! Porque é a fome com a vontade de comer na questão da treta. Mas se vocês olharem no meu FetLife, tá lá o fetiche em treta.
Ada: Real.
Kali: Real, oficial. No lado baunilha, eu sou bancária. Fiz o concurso, passei. Não vou dizer em qual banco exatamente eu trabalho, mas deu pra ver que é um dos públicos, né?
Meu chefe no banco, ele super sabe sobre tudo. Ele sabe que eu sou poli, sabe que eu faço Shibari, sabe que eu dou aula. Ele sabe muita coisa. Ele sabe que eu também faço show como camgirl. Enfim, eu sou uma pessoa bem pública. Bem fora do armário quanto ao BDSM. Pra mim, o que é baunilha e BDSM meio que se mescla. Eu tô no finalzinho do curso de arquitetura e urbanismo. E, se Deus quiser, eu me formo no final do ano que vem.
Eu descobri o BDSM… meu primeiro contato mínimo foi vídeo pornô de látex. Que eu achava o visual interessante, mas eu não sabia o que era aquilo. Eu só achava legal, bonito e beleza. Mas o primeiro contato real foi uma festa gótica em 2010.
Ada: O que já conversa com as suas paixões, né, amiga? Com as coisas que você gosta de fazer.
Kali: É muito redondinho. É muito o meu mundinho, tá ligado? Nessa festa estava rolando Rammstein, Marilyn Manson, bastante música desse estilo industrial. E daí subiu a Mistery no palco. Ela começou a pingar vela nos coleguinhas. Aí puxou uma chibata e um flogger. Ela e as outras meninas que estavam dançando começaram a bater em quem queria subir no palco.
Eu fiquei vidrada naquilo. Fiquei olhando assim, tipo: caralho, que massa. E eu achei muito legal, porque foi tipo femdom, né? Não eram caras ali. Eram caras apanhando. Que massa!
Eu namorava na época. Comecei a conversar com o namorado e fomos pesquisar sobre isso, tudo mais. Caí de paraquedas no FetLife. Comecei a ter contato com foto de Shibari, com foto de wax play, com várias outras práticas. Pet play também. Criei todo aquele universo na minha cabeça e fui parar no BDSM Curitiba, o grupo.
Ada: Sabe o que eu percebi? Não falamos o que é FetLife em nenhum dos episódios até agora. É tipo a rede social fetichista do mundo inteiro. Ela é bem parada com a galera do Brasil. Mas ainda serve pra você entender mais ou menos a cena, encontrar eventos e tal. Ter o seu perfil lá. Quase todo mundo da comunidade tenta pelo menos ter um perfil lá. Por mais que seja um perfil parado. É um jeito de encontrar a comunidade local e pessoas que praticam na sua área.
Kali: É sim. Tanto que eu conheci o Hugo por lá.
Ada: Olha só. E não faz tanto tempo, né? Foi tipo 3 ou 2 anos atrás.
Kali: Eu caí de paraquedas nesse grupo do BDSM Curitiba. Já anunciaram uma festa, eu fui na festa, comecei a conversar com a galera ao vivo. E eu caí de paraquedas, gente, num grupo de estudos chamado Not Vanilla. A gente criou uma galera que era muito, muito unida. A gente fazia evento toda semana. Sentava pra discutir alguma prática, alguma coisa. Tinha dommes, tinha doms, tinha galera que amarrava, tinha galera que fazia um monte de coisa.
Ada: Melhor lugar pra cair de paraquedas: num grupo de estudos.
Kali: E um grupo de estudos seguro, tá ligado? Era uma galera muito ponta firme. E eu lembro, nessa época, conheci algumas práticas que hoje em dia estão dentro do meu universo de práticas. Pra mim, sempre foi uma coisa do tipo: eu bati o olho nas paradas e eu falei: quero fazer isso.
Juro pra vocês, acho que eu nunca senti uma bad do tipo: ah isso é errado, isso é não sei.... Eu sempre aceitei muito bem o BDSM. Foi muito tipo: caralho, me encontrei.
Desde minha adolescência eu já sabia que eu não curtia umas paradas convencionais. Eu expresso muito isso no meu vestuário. Se vocês me verem indo pro banco trabalhar, eu posso sair do banco direto pra um happy hour fetichista. Eu vou com exatamente a mesma roupa. Não preciso trocar nem o batom.
E eu comecei tentando ser sub, gente. Eu já falei algumas vezes sobre isso. E tipo, cara, foi o maior fail da minha vida. Eu fui conseguir me submeter agora. Setembro pra frente.
Ada: Aí agora deu um pause no bottom por um tempinho, amiga?
Kali: Ah, não sei. Vai saber. Eu não sei quando que eu vou conseguir fazer uma sessão como bottom de outra pessoa de novo. Tá muito recente, tá muito confuso ainda na minha cabeça. Vamos aguardar cenas dos próximos capítulos.
Ada: Uma coisa de cada vez. Não precisa ter pressa por essas coisas.
Kali: Mas ó, eu não era tão pública sobre o BDSM e o Shibari até 2016. Eu tive um hiato ali entre 2014 e 2016 que eu fiquei totalmente fora do meio, não falava com ninguém, tava bem, porque eu tava passando por uns perrengues. Em 2016 me deu um estalo, eu falei assim: cara, eu sei o que tá faltando na minha vida.
Que foi também a época em que eu e meu ex-marido – o namorado lá de 2010 virou marido – em 2016, finalzinho do ano, a gente sentou e conversou, eu vinha mostrando pra ele alguns posts da comunidade Poly and Kink, alguma coisa assim lá do FetLife, comunidade gringa. Teve um deles falava sobre o serial monogamist, que foi o que deu aquela explosão, assim. Isso fez sentido pra mim, porque eu esperava terminar um relacionamento pra entrar em outro.
Ada: É isso que eu ia perguntar, se era um texto que associava o serial monogamist (monogâmico serial) com alguém que pode ser não mono… que, tipo, não precisa terminar um pra começar outro, pode ter dois simultâneos.
Kali: Exato! Eles falavam, cara, você não precisa encerrar um relacionamento porque você tá gostando de outra pessoa. Não que eu tenha feito isso alguma vez, eu sempre encerrava um relacionamento porque não tava legal e aí me permitia desenvolver sentimentos por alguém.
Mas aí quando eu vi aquilo, mostrei pra ele. A gente teve um atrito, porque a relação era monogâmica. A gente tinha uma relação meio aberta, mais ou menos, mas era só nós dois no dia a dia. Criei um perfil no Tinder e ele criou um também. Revolucionou a nossa vida. A gente conheceu outras pessoas, eu comecei a amarrar pra caralho, comecei a tipo, nossa, a me envolver muito mais na comunidade do Shibari, comecei a fazer workshop a rodo, queria muito melhorar a minha técnica.
Logo em seguida, comecei a me entender como top e foi tipo… aquela coisa assim tam tam tam tam, bem no meu ritmo normal, né? Mudança uma atrás da outra. E daí de repente, pá, novo nick. Me reapresentei pra galera. Falei: olha, gente, a partir de agora vou usar o nick de Kali.
Mas nessa época eu era super no armário. Aí em 2018 eu tive um atrito com uma pessoa que ameaçou me expor, aí eu olhei assim: quer saber? Ninguém vai me expor nunca nessa vida. Eu mesma vou contar pra todo mundo. Tomei o controle da minha vida e fui lá, contei pra todo mundo, abri um monte de coisa e foi libertador, gente, juro pra vocês, foi a melhor coisa que eu fiz.
Aí em 2019 eu fui pra Brasília, aí minha mãe assim: "O que você vai fazer lá?" E eu: vou dar aula daquele negócio de amarrar as pessoas. "Aff, que ridículo". Minha mãe, ela só acha ridículo. Ela nem tenta entender o que rola. E, pra mim é tudo bem, pode achar o que quiser. Não dá nada. Eu sei que eu amo, é uma coisa que me faz um bem danado, é uma coisa que me possibilitou conhecer o Hugo, gente.
Ada: É verdade.
Hugo: Então, Alene, conte-nos a sua história.
Ada: Ao mesmo tempo que eu gosto muito de falar de mim, eu fico me sentindo esquisita quando eu falo de mim, sabe? Mas, enfim, meu nome baunilha é Alene. Meu nick é Ada. Eu não me importo com vocês saberem. Aliás, muito do que estamos falando aqui é um aprofundamento do que já falamos no piloto. Desculpa aí o que estamos repetindo, mas é só pra vocês conhecerem a gente melhor e aprofundar aquelas coisas que já falamos lá.
Tenho 33 anos, minha profissão é tradutora e revisora, e eu sou originalmente do interior do Paraná, minha família é de uma cidadezinha do interior do Paraná, mas eu já moro em Curitiba tem quase 10 anos. Gosto muito daqui, não pretendo sair daqui apesar de ter muitos amigos em várias cidades do país.
Sou virginiana e sou aquela virginiana típica. Sabe todas as características do virginiano? tenho mais ou menos uns 92% [Risos]. Eu sou muito virginiana. Mas pra não dizer que eu sou 100% virginiana, tenho ascendente em sagitário, que me faz muito desastrada e meio louca.
Hugo: E não dá pitadinha de safadeza, não?
Ada: Sim, as pessoas falam que depois dos 27 você vira o seu ascendente. Eu não concordo com isso, acho que você aceita melhor e lida melhor com as características do seu ascendente. No meu caso, funciona, porque depois dos 30 eu fui ficando cada vez mais bêbada, piranha e desastrada. São características do sagitário.
Kali: Bom, tenho a lua em sagitário. Bêbada, check. Piranha, check. Desastrada? Eu cortei o dedo hoje quando tava cortando brócolis, então check.
Ada: E minha lua é em libra, o que me faz ótima conselheira, modéstia à parte. Porque eu sou aquela pessoa que nunca vai comprar só o seu lado, vou sempre olhar todos os lados da situação. Às vezes a Kali fica pistola comigo por causa disso.
Kali: Eu fico pistola, mas depois eu paro e penso no que ela falou e penso: puta que pariu, ela tá coberta de razão. Sério, se vocês precisarem de conselhos não peçam pra mim porque eu sou a pessoa pistolita do rolê, peçam pra Alene.
Ada: Eu gosto de falar que sou demissexual porque a minha orientação sexual e orientação de atrações, no geral, cada vez que eu estudo mais isso, eu adiciono mais uma palavra na minha descrição de orientação, porque eu com certeza não sou hétero, mas eu tô mais próximo de hétero do que de bi ou pan. E tenho isso também que minhas atrações vão depender muito da pessoa. Da conexão mesmo que eu crio com a pessoa, que é a descrição do demissexual.
Demissexual, pra quem não sabe, está no espectro da assexualidade, de um lado a pessoa que sente atração sexual é o alossexual que sente se ver uma pessoa que ela acha atraente, ela transaria com aquela pessoa naquele momento. E o assexual, que não sente ou sente a atração sexual muito raramente, sob circunstâncias muito específicas.
Eu me considero demi, porque eu preciso de coisas a mais pra ter essa atração sexual e pra ter outros tipos de atração também, né? Conforme você vai estudando, vai vendo que tem vários outros tipos. Atração romântica, atração estética, atração queer platônica… Enfim, vamos ter um episódio sobre assexualidade e a gente destrincha mais isso pra vocês.
Ando muito em crise sobre eu sentir atração romântica ou não, tenho achado que existe a possibilidade de eu ser arromântica que é a pessoa que não sente atração romântica, mas isso não significa que eu não sou carinhosa, afetuosa inclusive muito pelo contrário, né? Eu sou uma pessoa…
Kali: Extremamente carinhosa.
Ada: Sim, muito amorosa, tô sempre cuidando de todo mundo, amo demais meus amigos, tenho conexões muito profundas com os meus amigos. E não sinto essa necessidade de ter conexões românticas, de ter relacionamentos mesmo. O que conversa também com o que eu sou dentro da não monogamia, eu me considero solo poli e anarquista relacional.
Solo poli é a pessoa que quer desenvolver conexões, mas que não tem interesse em ter relacionamentos primários, em ter hierarquias, porque a prioridade da pessoa é ela mesma, né? "Solo poli" é o meu relacionamento comigo mesmo, é o principal, é o meu relacionamento primário e eu não tenho interesse em ter relacionamentos dentro de uma hierarquia.
É muito comum no não mono, poliamor, as pessoas terem hierarquias de relacionamentos e tal. E também não tenho vontade, hoje, não sei amanhã, mas hoje eu não tenho vontade de ter relacionamentos baunilha, de namorar, morar junto, casar, não é uma coisa em que eu penso, que eu vejo como necessidade na minha vida. Meus amigos são o suficiente pra mim e tenho relações e conexões que são o suficiente pra mim, que me deixam feliz o suficiente. Eu não sinto que falta nada.
E o anarquista relacional é a pessoa que considera todos os afetos, todas as relações significativas delas, com a mesma importância. Então mesmo se um dia eu for ter um relacionamento romântico sexual eu não vou considerar que esse relacionamento é mais importante do que as amizades profundas que eu tenho. Isso eu levo muito pra minha vida, sabe? O tanto que as amizades são importantes na minha vida, nesse sentido de não ter uma coisa que é mais importante que a outra.
Kali: Nossa, a gente é bem oposta nesse aspecto, né? Tenho esse jeito meio brabo e tal, mas eu sou muito romântica, nossa senhora. Chega a ser ridículo.
Hugo: Eu sou meio perdido nesse rolê. Já tive fases que eu achei que iria casar com o amor da minha vida, ter três filhos, um cachorro e tudo mais… E hoje em dia não.
Ada: Às vezes eu sinto isso, sabe? Estou muito nesse trabalho de autoinvestigação, no sentido de: é porque você é assim ou é só porque você tá muito desiludida com a vida?
Hugo: Eu gosto muito da ideia de ter uma companheira mas a quanto isso seria um casamento, a quanto isso seria um outro relacionamento… e aí eu não sei se, de fato, eu tô nessa fase de luto ainda por esse relacionamento ou se, de fato, eu não gosto, ou o quanto eu fui condicionado pela cultura, pela sociedade a esperar um relacionamento monogâmico.
Ada: Isso é muito construído socialmente, né? Tipo, você tem que ter um parzinho pra morrer com você.
Kali: Ai gente, eu super quero, cara. Tenho muito essa pira. Eu me sinto muito bem, muito bem mesmo, quando tenho o meu parzinho, dois parzinhos, três parzinhos, quatro, enfim. E eu descobri recentemente que é possível, sim, escolher fechar uma relação. Essa última relação que eu tive, eu realmente boto fé que dava. Nunca saberemos, né?
Hugo: Acho que eu passei pelo mesmo. Estou passando pelo mesmo fim, assim, esse último relacionamento que eu tive que já começou durante a pandemia – então não conhecia a pessoa fisicamente – foi o mais perto de, entre muitas aspas, de uma "alma gêmea". Alguém que batia muito as ideias. Só que além da distância, estamos em fases da vida um pouco diferentes agora. Mas foi bem perto de dar bem certo.
Desesperança, mas com alguma esperança, acho que a única coisa que nós somos consenso é com relação a filhos. Acho que nenhum dos três quer ter, né? Meu sonho seria…
Ada: Não, pera, antes de você continuar, deixa eu só falar: que coisa mais fofa isso que ele falou!
Kali: Nossa, velho, muito fofinho, né? Vontade de abraçar você, Hugo.
Ada: Sim, abraçar os dois, né?
Kali: Bateu um feeling aqui.
Ada: Eu queria falar disso ser um exemplo de como a gente é não mono. É uma garota que eu conheço, que é minha amiga também. Inclusive, beijo pra ela. Enquanto eles estavam fazendo as coisas deles, eu estava mandando no Hugo de vez em quando, ao mesmo tempo, ele estava ali administrando as duas.
Kali: A galera que não está envolvida nesse meio da não monogamia, não tem muito contato com essa palavra, mas esse é o sentimento da compersão, que é quando você ama tanto uma pessoa, que você fica feliz e se sente realizado quando ela está se sentindo feliz e realizada. Não importa que isso seja gerado por uma outra relação. E a gente às vezes demora pra conseguir se entender quanto a isso.
Ada: E eu sou uma pessoa que sente muita compersão também. Às vezes as pessoas reduzem ao contrário de ciúme. Não é exatamente o contrário de ciúme, mas é quando você fica feliz porque a outra pessoa está feliz mesmo que não seja com você. Às vezes você tem um contatinho, inclusive um dos meus contatinhos que eu mais fiz coisas, assim, que eu comecei a explorar o BDSM com ele. Eu não tenho nenhuma intenção de ter relacionamento, a pessoa conhece alguém e se apaixona e decide ter uma relação mono… é ruim pra mim, entendeu? porque eu perco o contatinho, porque a pessoa começa a ficar mono, mas eu fico feliz pela pessoa.
Kali: Eu sou uma pessoa ciumenta, mas é muito engraçado porque tenho muito ciúme das minhas coisas, mas tenho um pouquinho de ciúmes das pessoas com as quais eu me relaciono. Quanto mais sólida, mais firme eu sinto a relação, menos ciúme eu sinto.
Ada: Geralmente é de insegurança, né?
Kali: Total, meus ciúmes derivam totalmente de insegurança. É uma bobeira, tá ligado? Eu sei que é bobeira, mas vai explicar isso pra nossa cabeça.
Ada: Aí vem o trabalho de diálogo, de autoestima, de conversar sobre essas coisas.
Continuando, eu falei das minhas orientações não mono e entramos aqui num papo sobre não monogamia.
Eu sou muito nerd e quando eu descubro um assunto novo que eu gosto, eu investigo aquilo e começo a estudar, estudar, estudar e descobrir novas coisas. Volta e meia tenho uma obsessão diferente, eu encontro uma nova obsessão e aí eu fico louca por aquilo.
E eu descobri duas obsessões que são incríveis porque tem universos enormes dentro delas e eu nunca fico sem coisa nova pra conhecer. Que é, claro, o BDSM e outra paixão muito grande na minha vida é o teatro. Teatro e teatro musical. Eu amo muito e inclusive tenho um podcast há mais de 5 anos sobre um desses temas. É uma paixão muito grande na minha vida. E ao mesmo tempo que tem sempre uma prática nova de BDSM pra você descobrir, aprender um fetiche novo, pra você se interessar, sempre tem um musical novo saindo pra eu descobrir e assistir e tudo mais.
Eu sou de esquerda também, sou feminista também, eu gosto muito de sempre me identificar como uma pessoa gorda. Acho que faz parte do meu ativismo deixar claro que eu sou uma mulher gorda de esquerda, feminista, de humanas.
Eu sou uma pessoa que não sou muito boa de ser discreta e guardar segredos. Eu sou muito ruim nessas coisas, parece que eu tô vivendo uma mentira se tenho que omitir uma informação de alguém. Então, por exemplo, pra minha família eu não falei do BDSM porque acho que é uma coisa que quando eu for contar pra eles vai dar um certo trabalho de explicar, de contar todos os lados e tal. Mas a verdade é que eu também não consigo manter isso 100% em segredo. Imagino que eles até já saibam, como é o caso da família do Hugo. Eles já devem desconfiar, já devem saber, só que eles não querem ter essa conversa. E aí eu fico também, é melhor não ter essa conversa, e aí todo mundo finge que não sabe. Mas a verdade é que tenho muita dificuldade de guardar segredo, eu sou boca aberta pra caramba.
Todos meus amigos sabem, a única coisa que eu tomo cuidado é de não associar o meu perfil baunilha com o meu perfil kink. Pra também não chegar um povo sem noção sendo mal educado. Mas a verdade é que se o pessoal do meu trabalho – eu sou principalmente autônoma, não tenho vínculo empregatício – então se o pessoal que me passa trabalho ou a minha família soubesse, não seria um grande problema.
Não é uma coisa que eu me esforço muito pra esconder. Até por isso que vai aparecer os nossos rostos nessa vitrine e volta e meia eu apareço nos stories dos Chicotadas. Porque realmente não é uma coisa que tenho vergonha ou que eu sinto necessidade de esconder. Eu só não contei pra todo mundo porque é uma conversa que eu não tava tão afim de ter, mas se precisar ter a gente tem. Inclusive, você que é da minha família está ouvindo isso e quiser conversar comigo a respeito, pode vir, pode abordar o assunto, não tem problema nenhum. Não tenho vergonha das coisas que eu gosto, sou bem consciente do que eu faço, não sinto culpa, não sinto vergonha. É mais uma questão de conveniência e de preguiça de não ter saído do armário 100%.
Mas todo mundo que convive comigo sabe porque eu sou péssima de guardar segredo, muito ruim mesmo. Eu tive uma trajetória sexual bem diferente porque eu tive uma criação muito católica. A culpa católica é um negócio complicado, então eu demorei um tempo pra me libertar dessas coisas. Sempre tive um tanto de interesse em pegging que é aquela prática de uma mulher cis penetrar um homem cis com o uso de uma cinta. Eu sempre tive esse interesse, mas nunca tinha conseguido explorar, quando mais nova, eu tive um namoradinho perdi a virgindade e tal e depois disso rolou um bloqueio sexual muito louco, por causa de questões com o corpo, na época. Lembrando que tenho 33 anos, hoje, isso foi na época em que eu tinha 18, 19. Por causa de questões com o corpo, questões com religião… Então eu passei um bom tempo sem fazer nada sexualmente.
Fui me redescobrir e reviver, e ter meu renascimento sexual quando eu já tava com 28, 29, que foi quando eu me permiti descobrir novas coisas. E, nesse meio tempo, eu não fazia nada, eu tinha ainda um pouco de interesse, mas minha libida era muito baixa e tal. Parte desse renascimento também tem a ver com o fato de eu ter largado a pílula que eu tomei por 11 anos sem praticamente nenhuma necessidade. Por questão hormonal, mas eu nem precisava tanto assim. E apesar desse tempo de bloqueio, eu sempre fui a pessoa que estudou muito sobre sexualidade, conversava muito sobre isso com as pessoas, que eu sempre fui muito curiosa… E das pessoas virem me pedir opinião, me pedir conselho e geralmente eu sabia mais do que a média das pessoas com quem eu convivia.
Mesmo nessa época que eu estava começando a buscar isso em terapia, de desbloquear e de voltar a viver minha sexualidade de um jeito pleno, eu tinha dois amigos que estavam explorando esse mundo do BDSM, ao mesmo tempo, de formas diferentes. Um amigo daqui de Curitiba que tava saindo muito com os caras de aplicativo e um amigo de São Paulo que tinha esse interesse de muitos anos e finalmente tava tomando coragem pra realmente começar a praticar na comunidade. Teve uma época que ele participou da comunidade em São Paulo. O amigo daqui de Curitiba é o Vitor e o de São Paulo é o João, queria mandar um beijo pra eles, por que eles foram fundamentais na minha descoberta e tudo mais, a Pati conhece eles, principalmente o Vitor, né?
Kali: Beijo, Vitor!
Ada: Conforme eu conversava com eles sobre isso… eu nunca me choquei, isso é engraçado, porque mesmo sendo praticamente virgem eu sempre fui muito cabeça aberta. Sempre achei muito interessante conversar sobre essas coisas. E aí meus amigos meio que me instigavam, o Vitor falava: "você vai ser dominatrix, não sei o quê…" Porque eu sempre gostei da coisa do pegging, mas eu não me via fazendo. Porque quando a gente tem acesso a conteúdo é sempre a galera sofrendo e parece que tá horrível e aí tipo, não, eu quero que seja gostoso, não quero que a pessoa odeie, não quero fazer as pessoas sofrerem – quem diria que hoje em dia eu tô cada dia mais sádica, porque descobri que fazer sofrer a pessoa que gosta de sofrer é muito legal – E aí fui estudando também pra tentar ajudar o João nessa época que ele tava explorando a comunidade mesmo. E, conforme eu fui estudando, fui vendo que eu gostava daquilo, que parecia interessante, que tinha muito mais camadas de autoconhecimento e de comunicação, de diálogo, de sinceridade e de coisas às claras do que eu imaginava a princípio.
E fui ficando com vontade, fui ficando com vontade, até que descobri que uma amiga de uma amiga tinha um grupo de WhatsApp e aí entrei no grupo de WhatsApp, depois fui no meu primeiro evento munch e depois fui no meu primeiro evento mesmo, que foi uma festa de Halloween que foi quando eu conheci a Pati. Acho que eu tinha te conhecido no piquenique e aí te vi de novo na festa, que o João veio pra Curitiba também, que ele é de São Paulo, pra ir nessa festa. Aí o resto é história. A gente começou a ir em várias festas podo também na época, né, amiga? No comecinho de 2019 … que essa festa foi em 2018, a gente começou a ir em várias festas podo.
Kali: Nossa, que saudades dessas festas podo. A gente se divertia tanto.
Ada: Vocês se conheceram oficialmente no The Office, né? Mas vocês entraram em contato primeiro pelo FetLife, foi isso?
Kali: Isso, foi no FetLife. O Hugo me mandou uma DM lá. Aí eu olhei assim tipo, ah beleza, um cara sem foto, sem nada, quem que é esse cara? Aí ele insistiu no contato, porque eu sou assim gente, eu sou terrível com DM. Agora estou tentando ser mais acessível, mas era muito difícil porque eu tinha muita preguiça das pessoas.
Hugo: E também a qualidade das pessoas… até mesmo a minha qualidade de abordagem na época, eu não sei se era das melhores, tenho até medo de reler o que eu mandei.
Ada: Como eu estava falando, quem se conheceu primeiro foi o Hugo e a Pati, que foi essa história do FetLife e depois vocês se conheceram no The Office.
Hugo: Exatamente.
Ada: Eu conheci a Pati num piquenique de um grupo de WhatsApp e depois na festa, e depois a gente já virou amiga indo nas festas podo. E o Hugo, o Hugo não vai lembrar, mas eu conheci o Hugo num Atados. Quando era naquele parque, que era antes de ser na Praça do Japão.
Kali: No Bacacheri.
Ada: É, no Bacacheri. Será que a vez seguinte que eu te vi foi na vez que a Pati me ensinou a bater e pingar vela?
Hugo: Acho que foi.
Ada: Foi muito legal mas, ao mesmo tempo, até hoje tenho dor no coração que a gente não negociou direito e aí eu não sabia o que fazer na hora do aftercare, porque eu não queria invadir… ahh. A gente devia ter conversado melhor antes.
Hugo: A gente vai evoluindo.
Ada: Eu lembro que a Pati me ensinou a bater com alguns equipamentos. Só que foi um negócio assim: faz isso, faz aquilo… E a Pati e o Hugo já se conheciam. A Pati eu conhecia melhor, mas o Hugo eu não conhecia tanto. Então foi no dia que eu aprendi que se vai jogar com alguém, mesmo que seja só treino, tenha intimidade com a pessoa primeiro, você precisa ter intimidade com a pessoa para as coisas não ficarem estranhas.
Kali: Demissexual in a nutshell, né?
Ada: Total. Porque no final a gente conversou, óbvio, mas chegou uma quarta pessoa aleatória e aí eu ficava assim, tipo: Eu abraço o Hugo? Eu converso com ele? O que eu faço? A gente não combinou sobre o que falar, será que ele tá desconfortável? Mas eu tô desconfortável, ai meu Deus, o que eu devia fazer agora? E a Pati está distraída, não consegue me ajudar agora. Mas depois pedi muitas desculpas para o Hugo e sou mestre em dar colinho para o Hugo agora. Queria te dar um colinho hoje, inclusive, amigo.
Hugo: Pra mim não foi nem uma sessão, se eu não me engano, era um negócio de: precisa de alguém para treinar a mira? Beleza, bora. E sendo bem responsivo e tudo mais, falando tá bom, bate mais, bate menos não sei o quê…
Ada: E foi a primeira vez na vida que eu bati em alguém e pinguei vela.
Hugo: Desvirginei ela.
Ada: Mas eu lembro que foi muito legal e recomendo muito o Hugo para as pessoas aprenderem a fazer as coisas. Ele é um bottom muito comunicativo e que sabe o que ele quer, talvez até demais! Mas para quem está começando é excelente.
Hugo: É muito um contrato entre pessoas e a conversa e a comunicação ativa. Não tenha medo de dizer para a pessoa que você gosta daquilo ou que não gosta daquilo. Talvez, hoje, um dos grandes "arrependimentos" que tenho é que no meu último namoro eu nunca tive coragem de falar para a pessoa que eu gostava de meia usada. Porque eu achei que ela não ia gostar e tudo mais…
Ada: No seu último namoro baunilha você não falou para a pessoa que você gostava de meia?
Kali: Agora você fica pedindo para as amigas, né? Por falar nisso, quando eu voltar para a academia eu preciso lembrar de usar os meiões.
Hugo: Pessoas que estão me escutando, mulheres que praticam atividade física, estou comprando meias longas e usadas.
Ada: Você não tem amigos o suficiente para te mandarem meia de graça? Seu plano é ter um museu das meias suadas, quanto mais meias melhor.
Hugo: É porque assim, eu já fiquei: ah, vou pedir para ciclana. Aí você vai e pede, daí a pessoa esquece ou não vai… Decidi fazer um grande plano de arrecadação, que alguma coisa chega, estamos aí nessa campanha. Caso você queira ajudar estamos aí.
Ada: Mas esse namoro que você não falou das meias foi há quantos anos?
Hugo: Dois ou três anos atrás.
Ada: Pelo amor de Deus, Hugo. Porquê? Agora você está mais comunicativo, agora até com seu círculo que seria baunilha você não esconde mais, né?
Hugo: Não, não escondo tanto. E nesse sentido o podcast tem ajudado, porque você já é obrigado a falar…
Ada: E tem isso também, né? Acho que é mais difícil as pessoas que são bottom saírem do armário, ainda mais homem bottom.
Hugo: Pela própria ideia totalmente tosca e falsa de que se você é homem, gay, passivo seria pior… Mano, não, né?
Kali: Eu sou super a favor de dar o cu. Vai lá e dá, vai ser feliz. Ainda mais quem tem próstata. Seja homem cis ou mulheres trans, gente, dá o cu, é bom.
Hugo: Isso era tabu na época, só para você ter ideia como mudei.
Ada: É, agora está até aí… já passou a propriedade para o meu nome. Estou só esperando quando eu vou usufruir dessa propriedade, dessa raba.
Hugo: Isso é um ponto importante, quando eu falo para as pessoas que meu cu tem dona…
Ada: Eu, dona do cu do Hugo. Só preciso do cu aqui para eu usar!
Hugo: Ela me evangelizou das vantagens do cu, aí eu cedi essa concessão para ela, quando eu falo as pessoas ficam confusas… Nem sempre a vida é simples, né?
Kali: Mas nesse caso é bem simples.
Ada: Só a distância que complica.
Kali: Exatamente.
Ada: Bom, nosso estado civil. Somos 3 solteiros nesse momento?
Kali: Exatamente. Não estou procurando nenhum relacionamento baunilha no momento. Mas estou aceitando currículos. Não quer dizer que eu esteja procurando submisso ou submissa. Mas, por favor, nada de "sub campainha".
Hugo: Hein?
Kali: Sim, dom… sim, dom… sim, dom… Pelo amor de Deus, né? [Risos]
Não, sério, eu gosto daquele olhar desafiador, daquela pessoa que te instiga, sabe? Tem muita gente que vem e fala "eu quero ser seu sub" e a pessoa não fala de si, a pessoa não tem conteúdo nenhum, você pergunta alguma coisa e a pessoa mal responde. E você fica tipo, tá, beleza, assim eu não consigo conhecer você, dá licença? Eu não quero só um saco de pancadas.
Ada: Eu sou uma pessoa que está fechada para o baunilha também, porque se der vontade de transar e tal, eu sei que tenho amigos. Então eu não tenho interesse nenhum em começar relacionamentos baunilha. BDSM é aquilo, né? Estamos em pandemia ainda, mas conversar sobre… sempre tem aquela fase da conversa.
Kali: A negociação sempre pode ser feita via WhatsApp, Skype, etc.
Hugo: Eu estou aceitando currículos com meiões de anexo, por favor. Podem mandar.
Ada: Você considera que já teve D/s? Porque eu considero que já tive em fase de consideração, mas eu nunca fechei uma D/s mesmo.
Kali: Eu nunca, até hoje, passei da fase de consideração. Eu tenho 10 anos de BDSM mas eu só fui começar a pensar em ter um bottom no ano passado, antes eu estava mega satisfeita com avulsos. Agora que eu estou com a mãozinha coçando pra ter um bichinho pra chamar de meu, um elfo doméstico de preferência.
Hugo: Já eu, já tive uma D/s com uma senhora – que eu não consultei ela se eu posso citá-la – mas tive uma D/s, sim. Pela minha parte, acredito pela parte dela tembém, foi um relacionamento muito bom. Foi bastante tempo, mas não foram tantas sessões assim, pelas condições de vida, mas foi muito divertido, foi muito profundo. Sem a menor sombra de dúvida foi bem profundo pros dois.
Ada: Bom gente, agora que vocês tiveram um pouco de noção de como nós somos no baunilha, como foi a nossa descoberta e como é a nossa relação entre nós e com outras pessoas, a gente decidiu falar um pouco sobre como a gente é como praticante. Como o BDSM é esse universo gigantesco com tantas coisas que você pode fazer e tantas formas de viver esses fetiches e essas práticas, decidimos que cada um de nós vai fazer um top 5 de práticas ou fetiches favoritos e contando, um de cada vez, as nossas 5 preferidas e comentar um pouquinho sobre isso.
Então, vamos primeiro falar da nossa quinta prática ou fetiche preferido. Quem quer começar?
Kali: Acho que vai o Hugo.
Hugo: Por que eu?
Kali: Porque sim.
Ada: Porque a gente tá mandando.
Hugo: A minha quinta prática é humilhação.
Ada: Que tipo de humilhação você gosta, Hugo?
Hugo: Tipo a que rolou no episódio passado, serve como exemplo?
Kali: Humilhação em público?
Hugo: Mas em público reservado, que tenha noção do que está acontecendo...
Kali: É, sempre que eu falar em público pra qualquer coisa, sempre entendam: em público com todo mundo que pode vir a ver o bagulho, ou está vendo o bagulho, consentindo com ver o bagulho.
Ada: Em público, num ambiente controlado.
Hugo: E o seu, Alene?
Ada: Só isso? Você não vai falar mais? Você gosta de, por exemplo, ser colocado na berlinda e fazerem muita pergunta pra você que você tem que responder? Ou talvez te colocarem numa situação um pouco ridícula pra você passar uma vergonhinha mas ao mesmo tempo uma vergonhinha gostosa?
Hugo: Não sei, só sei que tô ficando com tesão.
Kali: Credo, que delícia! [Risos]
Ada: Então, acho que sabemos a nossa resposta, não é mesmo?
A minha quinta prática preferida é que, assim, eu demorei muito pra descobrir que podia ser legal bater nas pessoas, quando entrei na comunidade eu achava muito chato o povo se batendo, eu não via graça. Fui descobrindo conforme fui conhecendo masoquistas e aprendendo as técnicas. Mas quando se trata de dor física e causar dor física, a minha preferida disparada na frente, por isso que tá aqui em quinto lugar, é o tapa na cara.
Kali: Tapa na cara é uma delícia.
Ada: Como eu amo dar tapa na cara. Qual é o meu grande problema com cenas de impact play, de jogos de impacto, no X? Você só vê a bunda da pessoa, ela fica de costas. Você não vê a reação. E quando você está batendo na cara de uma pessoa, pode fazer isso olhando no olho dela. Então você consegue ver a reação, você vê se a pessoa está com tesão, se ela está com medo, quando ela reage porque você faz que vai dar o tapa e não dá. Ai, eu amo, consigo fazer uma cena inteirinha só com tapa na cara.
Óbvio que não seria uma cena muito longa, mas dá pra fazer uma cena inteirinha com tapa na cara e eu gosto de bater e aí fazer carinho, e aí dar beijinho e dar um tapão. Eu amo o tapa na cara. E você, Kali, qual é o seu número 5?
Kali: Meu número 5 é o trampling. O trampling, pra quem não sabe, é quando você anda ou pisa ou pisoteia o corpo de outra pessoa. Inclusive, no meu instagram de podolatria tem um vídeo de eu fazendo um trampling dançando em cima do menino.
Ada: Muito legal aquele vídeo.
Kali: É uma prática que eu tinha zero interesse por ela dois anos atrás. Quando eu descobri o trampling, achei muito legal porque tem alguns aspectos que eu gosto no BDSM. Ele tem técnica pra você fazer, tem a questão de você fazer ele de uma forma sensual ou de uma forma ogra, você pode fazer descalço, com salto, sem salto, de bota, de sapatilha, de tênis, pode fazer de várias formas…
Hugo: De chuteira.
Kali: De chuteira, as travinhas devem ser sensacional… deve doer pra cacete.
Ada: Acho que o Hugo quer fazer isso. [Risos]
Kali: Oi, Hugo, tudo bem?
Hugo: Existem vários tipos de chuteira. Tem algumas que, acredito eu, não dê pra fazer, mas existem outras chuteiras que aceitam.
Kali: Oi, Hugo, eu calço 38 tá? [Risos]
Kali: A senhora aceita usar uns 39 que tenho? Por acaso, tenho algumas chuteiras.
Kali: A gente põe duas ou três meias e tá tudo certo. Vamos marcar esse rolê. Cuspi muito pra cima e descobri o trampling. Achei ele fantástico, é muito divertido. E você consegue causar prazer, causar dor, causar um monte de coisa… Vou falar pra vocês, a sensação de poder de você estar de pé, com os dois pés fora do chão – um deles na coxa e o outro no tórax do ser humaninho ali – é muito foda.
E é muito legal porque, assim, a gente olha e o fulano é magrinho, que nem o Hugo, que é magro e tal… tenho certeza absoluta que ele aguenta tranquilamente uma domme com 100kg pisando nele se ela souber fazer, claro. Não saiam pisando aleatoriamente nas pessoas, por favor!
Ada: Pelo amor de Deus, tem jeito certo de pisar nas pessoas. Inclusive, é uma coisa que eu fiz pouquíssimas vezes porque só fiz com pessoas junto falando "pisa aqui, agora pisa aqui" nunca fiz sozinha, nunca estudei a fundo sozinha, mas as poucas vezes que eu experimentei é realmente muito legal. É uma coisa que eu quero estudar mais, aperfeiçoar mais a técnica pra poder fazer. Realmente, quando você faz as primeiras vezes… Eu sou gorda e nas vezes que eu fiz eu tava com 100kg, é bastante coisa então dá um medo de você quebrar a pessoa. Mas aí você vê que o corpo aguenta muito bem, se você pisa nos lugares certos.
Vai Pati, e qual é a sua número 4?
Kali: O exibicionismo. "Ué, Kali, mas você não é top?" E quem disse que eu não posso ser exibicionista? Meu aniversário do ano passado, eu fiz no The Office, juntei uma renca de gente…
Ada: The Office é um clube fetichista daqui de Curitiba.
Kali: Fiz meu aniversário lá, coloquei uma lingerie que brilha na luz negra, apaguei as luzes de uma das salas, liguei a luz negra e fiz uma autosuspensão. Exibida. A estrela da festa. Antes da pandemia teve uma festa que durou 12 horas lá, e eu passei a festa inteira semi-nua. Se tenho uma oportunidade de estar mostrando a figura e vendo que as outras pessoas que estão me observando estão ficando atraídas por mim, por causa disso, eu tô mostrando a figura. Se alguém quiser ver a foto, tem no meu perfil do FetLife. Vai lá e comenta o que achou, por favor, alimenta meu exibicionismo.
E você, Hugo, qual é o teu número 4?
Hugo: Tenho usado bastante o choque, não sei se é porque ele é uma das poucas coisas que eu aceito/gosto de autoinfligir. Essa estimulação elétrica, ela tem me divertido um pouco já que eu não gosto muito de outras coisas para fazer sozinho, é o que temos feito e tem me divertido. E é legal brincar com o controle remoto, as pessoas sempre acham divertido.
Ada: A minha prática número 4 é a prática de castidade, seja com ou sem cinto de castidade, não necessariamente precisa do cinto.
Hugo: A castidade alheia.
Ada: Sim, a castidade alheia, porque eu sou top então é a castidade do outro ser humaninho. Eu gosto porque você está ali controlando – ou tentando controlar – a libido da pessoa e o que ela pode e não pode fazer. Às vezes é uma pessoa que nem se masturba tanto, ela naturalmente ficaria duas semanas sem se masturbar, por exemplo, mas a partir do momento que eu viro para ela e falo "você está proibida de se masturbar" ela vai querer se masturbar. Porque assim é o cérebro humano, entendeu?
E a graça é justamente isso, a pessoa não esquecer que tem alguém controlando e dizendo que ela não pode fazer aquilo, porque aí dá mais vontade. E você sabe que aquilo está na sua mão, o fato da pessoa poder bater uma punheta e poder gozar ou não poder… é você que manda, tem que me pedir e aí estabelece o meu controle, a minha dominância.
E também é muito excitante você saber que, por exemplo, eu como domme estou podendo gozar e usar meu vibrador o quanto eu quiser o tanto de vezes que eu quiser e o bottom que está jogando comigo não. Vai passar uma semana, duas semanas, três semanas e dane-se. E tenho muita vontade de brincar com o cinto também, em uma situação em que as pessoas estejam no mesmo lugar, que eu possa ser a dona da chave – a key holder – e acho muito interessante porque é essa coisa do controle sexual da pessoa.
E a terceira prática preferida de vocês, qual é? Hugo?
Hugo: Podo. O loco das meias tem que aparecer em algum lugar.
Ada: Podolatria. Você gosta de uma podolatria específica, né, Hugo? Conta pra gente, caso não tenha ficado claro ainda a história das meias.
Hugo: Cerca de 40% dos homens, teoricamente, tem algum tipo de fetiche por pés, só que dentro desses fetiches pelo que eu li em algum site alguma vez na vida, existem mais de 27 tipos diferentes de especificações por pés. No meu caso, são meias de esporte compridas e sujas.
Ada: Você gosta do visual, mas você também gosta…
Hugo: Do olfato, do tato, do contato.
Ada: E da meia estar suada e quentinha depois de muitas horas de exercício físico, de preferência por vários dias.
Kali: Precisa ter chulé no caso?
Hugo: O fator humilhação aumenta nesse sentido, que dá aquela relembrada.
Ada: Mas se estiver só quentinha e molhadinha já é bom também, né?
Hugo: Já é bom também. E o seu Alene? Qual o seu terceiro item?
Ada: Meu terceiro item é anal play ou práticas anais. Gosto muito de plug, de pegging e de beijo grego. Porquê, né? Que delícia! A sensação de poder… Vamos ter muitos episódios só sobre isso. Um deles ainda não saiu mas já está gravado. Tem a sensação de poder, de ser você dando aquele prazer pra pessoa. E tem o fato de, assim, se você, mulher cis que nos ouve, nunca ouviu o gemido de uma pessoa dona de próstata tendo a sua próstata estimulada – não precisa nem ser penetração se a pessoa tem um bloqueio – pode ser aquele beijo grego e tal… Se você nunca ouviu esse gemido ou se o seu parceiro, a pessoa com próstata com quem você se relaciona, nunca se permitiu isso: conversem sobre isso, tentem uma linguinha, um carinho…
Poucas coisas no mundo são tão boas de ouvir quanto o gemido da próstata bem estimulada.
Kali: Esse gemido é muito foda.
Ada: Ao mesmo tempo que a pessoa que se permite isso, e que gosta e aceita explorar esse lado… tem toda essa coisa da vulnerabilidade, que me dá muito tesão também. A pessoa ter a confiança em mim de fazer essas coisas, eu adoro. E a sua número 3, Pati?
Kali: É bem clichê. Impact play ou jogos de impacto. Mas é aquela coisa, nesse aspecto eu gosto de bater em quem gosta de apanhar. Meu sadismo vai longe, mas ele vai acompanhando o masoquismo da outra pessoa. Brincando com a cane, por exemplo, ela é tipo a varinha de marmelo da vó, sabe? É um objeto comprido que você usa pra bater na pessoa e ele deixa uma marca compridinha. Se você pesquisar no Google "cane bdsm" vai aparecer um milhão de fotos. Tô fazendo lá e, de repente, a pessoa começa aqueles gemidinhos que é dor e prazer ao mesmo tempo. Beleza, você tá fazendo isso, aí você troca o instrumento aí você vê que a pessoa não tá gostando tanto… eu vou baixando, dá uma broxadinha, eu troco e volto pra um que a pessoa gosta. Eu vou junto, tá ligado? O prazer vai indo junto pra mim, nesse aspecto. É uma prática que tem um visual muito legal se souber fazer direitinho.
Hugo: Em segundo lugar, nós temos: bondage. Pra mim, bondage/shibari são coisas muito importantes. Acho que foi aí que começou tudo pra mim, desde a infância. E dos ciclos… isso é uma coisa que acho que é muito normal, pelo menos eu conheço várias histórias de pessoas que começam, aí somem, dizem que nunca mais vão voltar, jogam tudo fora, ou dão pra alguém. Aí volta, vai e volta…
Ada: E esses ciclos são bem clássicos.
Hugo: O bondage foi por onde comecei. Agora, mais recentemente, vim conhecendo o Shibari e em especial ganhando muito amor por ele, e respeito, com o grupo de estudos do coletivo Shibari. Ah, qual a diferença? Existe uma diferença estética, mas a diferença funcional é: o bondage você restringe como um passo para outras coisas, para outros tipos de estimulação, sejam elas desde você só tatear a pessoa, impacto… tudo que rolar, tudo que for permitido entre vocês. E o Shibari, normalmente, tem fim em si próprio, todo o processo de amarrar e de soltar, e o que você faz entre isso, tem a finalidade. O Shibari permite outras interações também, mas ele é mais autofocado. Existe a questão estética, existe a questão de troca, muito mais do que você chegar e algemar, passar o lacre, passar a fita silver tape e afins na pessoa. E o seu, Alene? Qual é o seu segundo?
Ada: O meu segundo lugar é worship ou adoração. Que é o quê? Eu ser tratada como a Deusa que eu sou, né, amores?
Kali: Merece, acho que é o mínimo.
Ada: A podolatria entra pra mim nesse quesito, eu gosto da prática da podolatria no sentido de: você vai adorar os meus pés e me tratar como a Deusa que eu sou. E outros tipos de adoração, seja no ato de servir, no ato de fazer tudo que eu desejo, me elogiar, todas essas coisas. Eu amo. Em prática/sessão eu gosto de aplicar isso com coisas de podolatria e às vezes também em outras partes do corpo, dependendo se a pessoa estiver merecendo. Gosto muito de ass worship. Com a pessoa com quem já estou jogando e tal, eu gosto da ideia de "você só vai merecer encostar no meu pé e no meu cu e olhe lá… vai precisar comer muito arroz com feijão pra encostar nessa buceta". Talvez isso seja muito pesado pra deixar no podcast, eu estou com um pouco de vergonha. [Risos] Mas é basicamente essa a ideia.
E o seu segundo lugar, Pati?
Kali: O meu segundo lugar vai pra hierofilia. Pra quem não sabe, é um fetiche mega polêmico. Lembrem-se sempre crianças, your kink is not my kink and that's ok – seu fetiche não é o meu fetiche e tudo bem – não vamos fazer kink shaming com ninguém. A hierofilia, no geral, é quando você tem tesão na hierarquia da religião, seja ela qual for. No meu caso, tenho gosto especial por blasfêmia com a religião católica. Por exemplo, fazer um spanking, me vestir de freira toda bonitinha, sem maquiagem, sem nada, e fazer uma sessão inteira assim. Com a pessoa me chamando de madre ou, fazer uma cena similar, ele vestido de padre e eu de freira tipo "padre, eu pequei".
Ada: Parte de mim acha isso muito interessante, mas acho que a culpa católica não permitiria eu fazer alguma coisa do tipo. Não que eu ache que é errado. A maioria dos fetiches, se eu tivesse uma relação com alguém que quer muito aquilo e que fosse muito importante e não fosse limite pra mim eu faria. Mas parte de mim fica assim "meu Deus, não! Mas ao mesmo tempo, sim!" Acho que, assim, gente se não existisse tabu na sociedade talvez o BDSM nem existiria.
Kali: Não teria necessidade.
Ada: Muitas das coisas que a gente gosta vem de algo que é tabu.
Hugo: Mas acho que existiria o BDSM como grupo de estudos de formas seguras de fazer as coisas perigosas.
Kali: Da mesma forma que a galera se reúne, sei lá, pra praticar parkour, por exemplo, a galera iria se reunir pra estudar essas paradas. "ah, você pode fazer esse movimento assim…" essa frase pode ser tanto numa reunião do grupo de parkour quanto do grupo de estudos de BDSM.
Hugo: "Ah, você que tem lesão no cotovelo, fazer assim, não. Segura seu punho assim e dobra aqui" poderia ser da aula de tênis…
Kali: Ou da aula de impact play.
Em primeiro lugar, nossa, que novidade, a Kali vai falar sobre o Shibari! Lá vem a Kali falar sobre o Shibari de novo. Eu só vou falar que é Shibari, todo mundo já sabe, todo mundo já conhece. O Hugo já descreveu bastante, e é isso.
Ada: Vocês querem tentar adivinhar qual é o meu e qual é o do Hugo?
Kali: Eu não faço a menor ideia. Se o teu não é cu, o que vai ser?
Ada: O que eu gosto mais do que cu?
Hugo: Acho que é obediência.
Kali: Controle? Ah, não sei.
Ada: Não. Do Hugo é prendedores, né, Hugo?
Hugo: Claro. Prendedores.
Kali: Sério? Eu achava que você gostava mais das meias do que dos prendedores.
Hugo: Acho que é porque os prendedores é fácil, eu tenho uma sacola, não preciso falar com ninguém. Digo, só falo que coloquem e pronto. As mesas você tem que pedir, a pessoa tem que fazer e tudo mais… Prendedores eu costumo usar tanto de roupa quanto aqueles de papelaria pretinho, sabe? Todos os tamanhos possíveis…
Kali: Ele tem uma sacolinha bem divertida
Ada: E prendedores de mamilos também.
Ada: Sim, prendedores de mamilos.
Ada: O meu preferido, que é uma prática e um fetiche que é muito amplo, é gigantesco, e é uma coisa que sempre permeia tudo que eu faço, um pouquinho que seja. Porque óbvio que não é pra todo mundo, tem gente que tem limite com isso então não dá pra pegar pesado. Mas assim, aquela levezinha pelo menos em algum momento se tá tudo combinado, conversado, eu coloco. É humilhação. Eu amo humilhação e degradação.
Kali: É verdade, eu fiz as contas aqui agora e você não falou de humilhação em ponto nenhum. Mas o Hugo falou, por isso que eu não pensei pra você.
Ada: Eu amo humilhação e é uma prática que envolve uma negociação mais extensa, quanto mais você aprofunda mais negociação precisa fazer. Porque mexe com muito tabu, com muita coisa que a pessoa já viveu, então não é uma coisa que você faz – eu pelo menos não acredito nisso, eu jamais faria – com alguém que você acabou de conhecer, que você não negociou direito. É uma coisa que tem que ser negociada muito especificamente.
Tenho alguns limites com humilhação, tem algumas opressões que eu não tô disposta a brincar com aquilo, mas o que tá dentro do que os meus bottoms gostam e eu gosto, seja humilhação física, seja humilhação emocional, seja degradação, eu acho muito gostoso de fazer.
E também tem a coisa de se divertir. Eu adoro colocar o bottom numa situação meio constrangedora, obrigar ele a fazer alguma tarefa que não faz muito sentido mas que eu vou rir daquilo… Eu amo eu me divirto demais. Mas é aquilo, com pessoas que você conversou muito direitinho e que gostam muito daquilo. Como o Hugo, né, Hugo?
Hugo: Exatamente. E é uma coisa que a pessoa tem que ter uma estabilidade emocional e psicológica pra poder brincar. Pode ser pesado, pode despertar gatilhos não revelados. Por exemplo, se um dia vocês me verem dançando, que não seja forró, deixar claro isso, provavelmente é uma tarefa da Alene. E eu peço desculpas antecipada.
Kali: Porque? Você dança muito mal, Hugo?
Ada: Eu achei divertido.
Hugo: Eu danço muito mal.
Ada: Teve uma vez que o Hugo pediu uma punição… Gente, a pessoa vira e pede uma punição achando que eu vou botar prendedor nele, entendeu? Achando que eu vou fazer alguma coisa que ele gosta. Eu falei: você precisa de uma punição? Ok. Vai aprender duas coreografias de fit dance e vai apresentar pra mim. Aí foi isso que ele fez e foi muito divertido. Vamos aprender mais coreografias, Hugo?
Hugo: Sem tempo pra agora, senhora, estaremos anotando seu pedido para mais tarde. Assim que for possível retornaremos com a sua solicitação. Quer anotar o protocolo, senhora?
[Risos]
Kali: Uma coisa que vocês não falaram, que acho bem importante falar sobre a humilhação, é que é muito necessário um aftercare muito bem feito depois.
Ada: Sim, para ambas as pessoas.
Kali: Quem é o top vai se autoavaliar, vai descobrir o que precisa pra aftercare, conversar com o bottom, o bottom tem que se autoavaliar também, vai descobrir o que precisa de aftercare e vão sentar os dois e fazer aftercare um pro outro de forma horizontal depois da sessão. Gente, pode dar uma merda gigantesca, psicologicamente falando. É uma prática tão gostosa que não vale a pena deixar ela dar merda, você vai acabar estragando a experiência pra você e pra outra pessoa.
Ada: Quando eu falo que permeia tudo que eu faço, não é que toda sessão que eu faço eu humilho a pessoa. Por exemplo, sempre que tem uma brincadeira verbal, uma coisa do tipo: você tá gostando disso, né? Isso já é uma humilhação leve, no sentido de botar a pessoa na berlinda. Eu gosto de ser verbal durante as cenas. Tipo, o que as pessoas iam achar se vissem você assim apanhando?
Eu adoro quando o bottom é verbal. Eu gosto de jogar com pessoas que conversam, porque eu gosto de conversar de volta e fazendo aquele jogo. Tenho uma partner que é muito escandalosa e às vezes ela começa a gemer de um jeito que você acha que ela tá morrendo. Aí eu viro e falo no ouvido dela: "tá ruim? Quê? Não tá ruim? Fala mais alto, o pessoal tá achando que você tá morrendo" Aí ela grita: "não!". Tá bom, agora eu entendi, porque se tiver ruim eu paro. [Risos]
Kali: Lembro disso, já vi uma cena assim de vocês. Vocês são muito fantásticas em cena, têm uma química maravilhosa.
Ada: Saudades de jogar com ela. Beijo, amiga.
É nesse sentido. Eu gosto muito de humilhação e degradação, tenho vontade de fazer coisas muito pesadas, mas eu ainda não fiz 20% das coisas que eu quero fazer. Porque realmente são coisas que tem que conversar muito, tem que ser uma pessoa que goste muito daquilo também. Tem que estar tudo alinhado, tem que estar todo mundo com a terapia em dia, consciente de que gosta daquilo e porque gosta daquilo.
Volta e meia a gente encontra pessoas querendo ser humilhadas aleatoriamente e você vê que a pessoa quer a humilhação porque ela acha que merece aquilo, não é porque é uma coisa que dá um tesão naquele momento e que ela consegue separar da realidade. Então é muito importante entender que o momento da prática não é a realidade e conseguir fazer essa diferença e cuidar desse aftercare pra gente ter aquela segurança de que vai todo mundo ficar bem.
Kali: Lembrando que pra algumas pessoas o aftercare vai ser esse tipo de coisa mais próxima com abraço, com carinho, tem outras pessoas que elas só vão querer ser deixadas de lado um tempinho e depois vão fazer outra coisa. Tem gente que vai sentar e vai bater um papo, vai discutir, dar um feedback da sessão. Cada um com o seu aftercare. Mas é muito importante que ele seja feito da forma que as duas pessoas precisam. Se uma pessoa precisa de colinho e cafuné e a outra precisa ficar no cantinho, negocia antes qual vai ocorrer primeiro, mas os dois tem que ocorrer.
Ada: Ou vocês não jogam.
Kali: Se não tiver compatibilidade nenhuma do tipo "ah não, eu não consigo fazer isso" não façam a sessão, não joguem, porque vocês claramente não têm uma compatibilidade pra jogar.
Hugo: Kali, Me diz aí qual limite seu flexível ou rígido que é pouco comum?
Ada: Isso é legal, que a gente fala do que a gente gosta e é importante também falar que todo mundo tem limite e que nem sempre os limites são aquelas coisas que a maioria das pessoas vai ter, sabe? A gente decidiu falar de alguns limites que não são tão comuns. O nosso limite que "parece que só eu tenho esse limite", nesse sentido.
Kali: Esse é um limite que é engraçado porque eu vejo muitos tops que curtem isso e eu tenho pavor, que é a eletroestimulação e outros tipos de eletro play. Por exemplo, eu fui numa festa ano passado, apareceu alguém com um taser, eu queria gritar, correr, fugir, queria chorar, porque tenho pavor disso, medo irracional e estúpido. Eu sei que na eletroestimulação o choque é bem fraquinho, regulável não sei o que… pode ser mais forte mas é regulável. Cara, só de pensar em manusear aquilo já me dá um ruim… eu ia brochar completamente. Pra mim não dá, não dá, não dá!
Hugo: E o seu, Alene?
Ada: Então, eu não tenho nenhum limite rígido pouco comum. Mas tenho dois limites flexíveis que você não costuma ver muita gente falando disso. Um deles é até meio bobo, porque é uma coisa que eu uso, já usei em cenas muito específicas. Que é como eu falei no tapa na cara, eu gosto de ver o olho da pessoa, então eu não gosto de venda, eu não curto venda.
As únicas situações em que eu já usei venda foi assim, num dia que eu tava muito atrapalhada, muito iniciante, eu não queria que o bottom visse eu me atrapalhando. Então você bota uma venda e finge que você tá tirando um sentido dele mas é só porque você não sabe direito o que você tá fazendo e precisa de tempo pra respirar. Ou prática de sensações, sensation play, que você vai, por exemplo, passar coisas no corpo da pessoa, causar arrepio, cócega, é mais interessante que a pessoa não veja o que você está fazendo. Mas são as únicas situações que eu penso em usar venda venda, não é uma coisa que me deixa excitada, porque eu gosto de ver a expressão no rosto do bottom, eu gosto de olhar pro olho dele.
Kali: Eu gosto muito de usar a venda – no caso, o tenugui no Shibari – porque faz parte da privação de sentido pra elevação do tato, né?
Ada: Uma prática que eu não tenho nenhuma vontade de aprender, nenhuma vontade de explorar, é afogamento. Tenho um pouco de fobia de água, não tenho vontade de brincar com esse negócio de cena de tortura, enfiar a cabeça da pessoa no balde. Não.
Kali: Tenho vontade de fazer isso, sabia? Mas pendurar a pessoa de cabeça pra baixo e descer ela no balde e tirar…
Hugo: O meu é um clássico dos anticlássicos que é "me bata o quanto você quiser, só não me faça cócegas". Brincadeira, não sou tão resistente assim no impact play, mas cócegas assim, um pouquinho pra dar aquele incômodo, vai tranquilo, mas cócegas pra valer não, é limite rígido.
Ada: Eu conheço alguns bottoms que são masoquistas, "faz tudo o que você quiser comigo, mas não me faça cócegas". Gente, cócegas é uma tortura muito eficiente, ainda mais se a pessoa estiver 100% presa, me dá desespero só de pensar – eu no lugar do bottom – eu fazendo acho que seria muito legal.
Kali: Eu, Kali, tenho um problema. Quando eu faço cócegas nos outros, eu começo a rir junto o mesmo tanto que a pessoa tá rindo. É uma empatia tão forte que não dá, tá ligado?
Ada: Mas acho que essa que é a graça de uma cena de cócegas, de tickling.
Agora, vamos falar de práticas que a gente quer aprender, ou cenas que assim é minha cena dos sonhos, quero fazer isso um dia, e uma das coisas que eu quero muito fazer é uma cena de cócegas, tipo, prender a pessoa bem presinha e só se divertir ali. E é um negócio assim, como que você vira pra mim e fala que BDSM tem que ter sexo tradicional? Não faz o menor sentido. Mano, quer coisa mais divertida e lúdica do que prender alguém e fazer cócegas até a pessoa se mijar de rir? Isso é BDSM, cara!
Kali: Eu não conseguiria. E não é nem porque eu não teria essa pira em fazer, porque eu super teria a pira de fazer cócegas na pessoa até a pessoa fazer xixi na calça, mas eu não conseguiria, porque eu não consigo! [Risos]
Ada: Você ia mijar junto. Você ia mijar na calça antes da pessoa.
Kali: Provavelmente.
Hugo: É, só não pode mijar antes. Depois até vai… vai que a pessoa curte também, né?
Então, de coisas que eu quero… acho que tem um sonho antigo que estamos aí em planejamentos. Que se não fosse o "micróbio" já teria rolado pelo menos uma vez, que é a do sequestro.
Ada: Você quer ser sequestrado, né, Hugo?
Hugo: Exatamente. Mas eu acharia divertido também sequestrar uma pessoa. Coisas que eu penso em melhorar é melhorar meu Shibari, melhorar a conexão, as técnicas, e melhorar no jiu-jitsu pra brincar melhor com as caçadoras.
Ada: Primal play. Ou dá pra chamar de rough body play também, se é lutinha… Tem outro nome também…
Hugo: Brincar de lutinha… com algo a mais.
Ada: Além da cena de tickling, tem duas cenas que eu quero muito fazer que envolvem o meu voyeurismo e um deles envolve voyeurismo e humilhação, humilhação mais pesadinha. Tenho muita vontade de fazer uma cena de public disgrace, eu controlando uma sessão conjunta de public disgrace. Só que é uma cena difícil de levantar, porque você tem que ter muitas pessoas que sejam confiáveis e tal. Tipo os bottoms que gostam, conheço pelo menos duas meninas que querem muito fazer uma cena assim. Só que aí você tem que juntar uma galera que seja todo mundo confiável, negociar aquela play conjunta, ver os limites de todo mundo, conseguir controlar todo mundo, mas é uma cena que tenho muita vontade de fazer.
Public disgrace ou desgraça pública é assim, você vai pegar um bottom e no caso eu comandaria a cena e colocaria todo mundo pra usar aquela pessoa, ela seria usada por todos os tops do ambiente. Com N práticas, o que não for limite da pessoa. Envolvendo práticas sexuais também. Eu já fiz uma versão mirim de public disgrace, mas era uma festa que não podia penetração, não podia oral. A gente usou vários dildos, deu uma brincadinha, foi super legal, mas foi uma versão mais soft.
E você, Pati, qual é a cena ou prática que você quer explorar?
Kali: Eu já estou começando o treinamento, que é o chicote longo. Eu já falei aqui que não era sádica, necessariamente… talvez. Mas é aquela coisa, sempre tem demanda. Pra toda mão que quer bater, tem uma bunda pra apanhar. Se organizar direitinho…
Hugo: Vamos pro nosso último bloco de perguntas.
Ada: Então eu pergunto pra vocês, quero que a gente responda e no futuro eu vou querer muito que os nossos convidados respondam isso também: qual conselho você daria pra você mesmo quando você começou a praticar? Que conselho você acha que faria toda diferença se você tivesse ouvido naquela época em que você estava descobrindo o BDSM?
Kali: Cara, eu falaria pra mim mesma que: primeiro, gênero não define posição. Não é porque você é homem, não é porque você é mulher, que você vai ser top ou bottom, e não faltava exemplo ao meu redor, mas eu chegaria e falaria isso com todas as letras. E eu diria: experimenta, vai lá e brinca um pouco de tudo, sabe essas palestras e workshops e etc que você está vendo no grupo de estudos? Vai lá e experimenta. Porque eu demorei muito tempo pra experimentar as coisas, eu morria de medo. Joga o medo no bolso e vai com medo mesmo, experimenta um pouquinho de cada vez, com gente de confiança.
E você, Hugo?
Hugo: Acho que eu diria: vai com calma porque não é uma moda, é parte de você. Não é um negócio que vai sumir amanhã, não é um negócio escasso, pelo contrário, é um negócio que está com você. Sua primeira sessão não precisa ser esplendorosa, vamos jogar bem a real, dificilmente a primeira sessão vai ser boa. Como a primeira coisa de quase tudo na vida, você vai estar com muito medo, vai estar muito ansioso. Vai com calma, leve seu tempo, estuda.
Eu pensei em colocar "estuda mais", mas eu fiquei pensando que, mano, na época não tinha o que estudar. Como eu não sabia inglês, não tinha. Hoje tem alguma coisa pra ler em português, mas antigamente não tinha nada. Antigamente é 5 anos atrás.
Kali: Verdade.
Ada: Hoje em dia já tem uma galera produzindo conteúdo. Mas realmente, 3 anos atrás não tinha conteúdo em português. Eu aprendi tanto, eu estudei tanto, consegui pegar tanta coisa porque eu sei inglês.
Kali: Eu também, a maior parte das coisas que aprendi ao longo do tempo, ou veio do grupo de estudos, que alguém aprendeu com outra pessoa ou na internet, em inglês, ou eu pesquisei e aprendi inglês na internet, principalmente no FetLife.
Ada: Eu, primeiro: não precisa ter tanto medo. Porque eu demorei muito pra começar a tentar entrar na comunidade, que eu tinha pavor, sei lá do que que eu tinha tanto medo. Eu sempre fui boca aberta, sempre fui sem vergonha, sempre falei de tudo, era natural, mas eu tive muito medo de entrar no meu primeiro grupo de estudo, de ir no primeiro evento, de conversar com as pessoas, de dar minhas opiniões… eu tinha medo de tudo. Mesmo naquela época eu já tendo estudado bastante, já tendo uma base, eu ficava assim "não vou falar que eu vou falar merda".
Então, primeiro, não precisa ter tanto medo. Segundo, vai no seu tempo, não se compare e para de se preocupar com as opiniões alheias. Porque eu me boicotei muito, eu me segurei muito, eu me privei muito no início por causa de uma certa pressão invisível que existia. Das pessoas colocarem expectativas em você, julgar se você é boa ou não porque você faz isso ou não faz aquilo… E cara, cada pessoa tem seu tempo, o meu tempo é muito lento, mas quando eu comecei, quando eu tive a segurança de começar, de fazer as coisas mesmo, nunca mais parei. Mas eu sofri muita pressão de "por que você não tá fazendo nada nas festas?", "porque não tá jogando em público?", "tem alguma coisa esquisita, será que ela é domme mesmo?". Não tente usar o tempo das outras pessoas como regra pra você, vai no seu tempo.
Hugo: E aí, coisas que aprendemos com o BDSM? Posso colocar que a minha capacidade de comunicação e a minha autoaceitação em relação a tudo, inclusive ao meu corpo, deslanchou muito mais com relação ao BDSM. Porque se eu sou hoje capaz de falar que eu gosto de meias fedidas e suadas sem nenhum pingo de vergonha, eu fico imaginando que outra coisa eu teria vergonha ou medo de falar. Quando você negocia e essa negociação é bem clara, as coisas tendem a fluir.
Isso vale tanto pro mercado de trabalho quanto pra família, tudo… A gente tem lá as soft skills e essa parte de comunicação é bem batida, o pessoal reclama principalmente da falta de comunicação dos programadores que não sabem transitar entre as linguagens humanas e explicar pra uma pessoa que não é do meio. Então, acredito que eu ganho pontinhos porque o BDSM tem me ajudado nisso.
Ada: Isso é incrível, e é crucial pra fazer o BDSM bem de forma segura e conseguir trocar feedback. Nesse sentido, tem muito que o BDSM me ensinou, mas tem muito também o que a comunidade me trouxe, o que eu aprendi com a comunidade, todas as conexões que eu fiz, todas as novas relações que eu tive, toda essa sensação de pertencimento, de não estar sozinha, de ter outras pessoas que curtem essas coisas como eu. E nesse ponto que é muito positivo quando você se permite se abrir, conhecer pessoas e conversar sobre aquilo que você achava que era tão bizarro dentro da sua cabeça. Mas não é, cara, tem uma galera que gosta das mesmas coisas que você e tá tudo bem.
E também teve toda uma camada de elaboração, de questões pessoais, de autoexploração, autoconhecimento, que foi muito benéfico. Mas com certeza o principal é descobrir uma comunidade de pessoas muito legais que eu quero levar pra vida e aprender constantemente. Acho que é isso.
Kali: Eu faço das palavras de vocês dois as minhas. Teve muito essa questão da comunicação. Por mais que eu fale pra caramba eu sempre pequei na minha comunicação em relações, etc. A questão do diálogo sempre foi muito complicada pra mim num relacionamento, estabelecer limites, estabelecer coisas que são ok pra relação, toda essa parte tinha muita dificuldade.
E a questão do autoconhecimento, que eu estou o tempo todo me reavaliando como pessoa, como top, como praticante, como cidadã… E me trouxe umas amizades fantásticas, duas das quais estão aqui agora dialogando comigo, né? Inclusive, duas das mais importantes que o BDSM me trouxe. A maioria dos meus amigos, hoje em dia, tá no meio. Alguns que não eram do meio estão entrando.
Ada: Isso que é legal de ser fora do armário, que a gente é tão apaixonada por aquilo que ou a gente pelo menos ajuda a desconstruir o preconceito dos nossos amigos, ou eles ficam interessados em realmente experimentar e conhecer. Nossa, eu levei vários amigos pra comunidade.
Kali: Obrigada por eles, porque eles são fantásticos também. E também tem a questão de que o BDSM me permitiu conhecer muita gente, não só aqui em Curitiba, na comunidade, mas em outros estados, ter uma rede de contatos no Brasil inteiro, ter gente com quem eu consigo dividir e consigo mostrar essa parte de mim e eu sei que eu não vou ser julgada.
Isso que a Alene falou, do senso de pertencimento, é muito importante, e pra mim sempre foi uma questão, que eu nunca me senti pertencente a nada. Comecei a me sentir pertencendo a uma comunidade quando eu comecei a conversar com o pessoal da comunidade de Shibari. Então foi um negócio assim: cara eu me achei. Essas pessoas também são de vários lugares, várias vertentes, mas elas me entendem, elas entendem que tenho uns gostos peculiares e que tudo bem. Essa comunicação sem julgamento que rola no meio é tudo pra mim.
Ada: Eu acho muito divertido quando chega alguém no grupo e fala "nossa, tenho fetiches muito estranhos, eu sou muito bizarro", aí a gente fala, tá bom, fala do que você gosta. Aí a pessoa fala e a gente "ah, era só isso? Ok fulano também gosta, ou eu também gosto". [Risos]
Kali: No Tinder rola muito isso, porque a galera lê meu perfil, fica curiosa e vem dar like, vem querer conversar. Aí eu pergunto, me conta de você, você tem algum fetiche? "Ah, nossa tenho uns fetiches, mas eles são meio hard, é que eu gosto de puxar o cabelo e dar uns tapas". Sério? Eu também gosto, adoro pegar pelo cabelo, esfregar a cara no chão, dar uns tapas na cara bem forte, tá ligado?
Ada: Cuspir na cara…
Kali: Olha, eu nunca cuspi na cara de ninguém. Agora eu quero. Sabe o que eu gosto? Lamber, pegar e lamber a cara inteira da pessoa e deixar ela toda melada.
Hugo: Vem em nóis, vacina, pra gente fazer umas lambidas, uns cuspes.
Ada: Que coisa louca aquele momento em que o cuspe na cara começou a ser edge play, né? [Risos]
Hugo: Então, galera, se você ficou curioso, curiosa, com a nossa nossa trajetória, o próximo episódio tem a ver com isso mas é um quadro surpresa. A Alene não libera que eu fale mais nada além disso. É um piloto especial, esperamos seus feedbacks e disque "meia-0800-sox", estamos aguardando.
Ada: Por hoje foi isso, se você tiver algum comentário a fazer, seja feedback positivo, puxão de orelha, perguntas, histórias, ou mesmo para anunciar um produto local ou serviço aqui no Chicotadas, manda uma mensagem pra gente! O Instagram do podcast é @chicotadaspodcast e você também pode enviar um e-mail para chicotadaspodcast@gmail.com ou mandar uma mensagem anônima pro nosso Curious Cat, que também é chicotadaspodcast. Manda que vamos adorar e podemos ler sua mensagem, não revelaremos seu nome sem a sua permissão, é claro, em um dos nossos próximos episódios. E pra entrar em contato pessoalmente com cada um de nós, é só nos seguir nos arrobas do Instagram, o meu é @rainha.ada.
Kali: O meu é @riggerkali. Ou @kali.feet.
Hugo: O meu é @aprendiz_bondage no Instagram, podem seguir lá e mandar foto dos pés.
Kali: Esse foi o Chicotadas de hoje, obrigado a você que nos ouviu até aqui, esperamos que tenha gostado. Lembrando que nós somos apenas amigos, não especialistas, que amam esse universo e que querem tornar o conteúdo sobre BDSM, sexualidades alternativas e não monogamia mais acessível para mais brasileiros. Não temos nenhuma intenção de ser donos da verdade e queremos criar um ambiente saudável para troca de experiências e o debate com vocês que nos escutam. Nossos episódios serão lançados a cada duas semanas, sempre nas segundas-feiras e esperamos te ver de volta por aqui no próximo.
Com o fim da nossa sessão, chegou a hora do aftercare, qual vai ser o aftercare de vocês hoje?
Ada: O meu vai ser um banhão bem gostoso, bem quentinho, lavar o cabelo, botar um pijaminha quentinho, ficar bem confortável. Parece bem um aftercare mesmo.
Hugo: Bem cara de aftercare. Depois dessas quase três horas e meia de gravação, tô devendo umas flexão, que tenho que fazer e gravar. E depois disso dormir, porque já passamos do horário…
Ada: Lembrando que não é nem 22h, o Hugo que dorme cedo mesmo. E você, Kali?
Kali: Eu vou seguir a mesma vibe do banho quente, tudo mais, lavar o cabelo, comer alguma coisinha gostosa, quero ver se eu não vejo um filme com a minha amiga. E é isso, gente, bem aftercare mesmo. Pijaminha, cara, a melhor coisa.
Hugo: Produção e distribuição: Alene; divulgação nas mídias: Kali; pentelho: Hugo.
[Risos]
Ada: Como que é seu sobrenome mesmo? [Risos] Ah tá, ele falou de propósito, olha que safado. Muito pentelho!
Kali: É por isso que a gente te ama, Hugo.
Ada: Acho que é isso, né, gente? Bom aftercare pra vocês. Beijos!